DEFESA PREVIA-TRÁFICO DE DROGAS-ASSOCIAÇÂO.

Aviso legal: Este é um modelo inicial que deve ser adaptado ao caso concreto por profissional habilitado.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DA CIDADE (UF).

Rito Especial

Tipo penal: Art. 33, caput c/c art. 35 da Lei 11.343/2006

[ Formula-se pedido de “liberdade provisória, sem fiança ]

Proc. nº.  7777.33.2222.5.06.4444

Autor: Ministério Público Estadual

Acusados: Nome XXXXX

                                                Intermediado por seu mandatário ao final firmado, causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, sob o nº. 112233, comparece o Acusado para, na forma do art. 55, § 1º, da Lei Federal nº. 11.343/2006 c/c art. 394, § 2º, da Legislação Adjetiva Penal, tempestivamente, no decêndio legal, oferecer sua

DEFESA PRELIMINAR,

( com pedido de “liberdade provisória”)

quanto à pretensão condenatória ostentada em desfavor de FRANCISCO FICTÍCIO e outro, já qualificados na exordial da peça acusatória, consoante abaixo delineado.

1 – SÍNTESE DOS FATOS  

                                                O Acusado, juntamente com João Fictício, foram denunciados pelo Ministério Público Estadual, em xx de abril do ano de yyyy, como incurso no tipo penal previsto nos arts. 33 c/c art. 35 da Lei Federal nº. 11.343/2006, pela suposta prática das condutas delituosas abaixo descritas.

                                               Segundo a peça acusatória, na tarde do dia xx de março de yyyy, por volta das 13:00h, integrantes da Polícia Militar lotados na 00ª Companhia do 00º Batalhão desta Capital, realizavam rondas de rotina nas proximidades do bairro fictício. Em dado momento, avistaram o veículo marca Fiat, placas XXX-0000, conduzido pelo ora acusado, o qual, quando avistou a guarnição, acelerou o veículo empreendendo fuga do local

                                               Diante disto, os Soldados da citada guarnição procederam imediata perseguição e, nas proximidades da Av. X, na altura do número 1122(em frente a Farmácia Vida), conseguiram obstar o veículo. Ato seguinte, procederam a devida abordagem no automóvel ora mencionado, realizando também revista pessoal em ambos os Acusados, logrando encontrar com o primeiro Acusado a quantia de R$ 273,00(duzentos e setenta e três reais) em dinheiro.(auto de exibição e apreensão de fls. 14).

                                               Ato contínuo, foi realizada revista no automóvel do ora Acusado e em seu interior foram apreendidas “7(sete) pedras de substância, aparentando ser ´crack´, pesando 60(sessenta) gramas, acondicionadas em uma embalagem de plástico transparente.”(termo de exibição e apreensão de fls. 15). Segundo o laudo de pericial de constatação de fls. 14/17, tratam-se de pedras de substância identificada como tóxica, popularmente denominada de “crack”, com reação positiva para cocaína.

                                                           Assim procedendo, diz a denúncia, os Acusados violaram norma protetiva da saúde pública, tratando-se de delito de perigo abstrato para toda a coletividade, tendo em seu poder/transportando, com intuito de comércio ou venda, substância entorpecente que determina a dependência física e/ou psíquica, cuja utilização encontra-se proibida em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

                                               Diante disto, os Acusados foram flagranteados naquela mesma data, pela violação dos comandos legais estipulados na presente peça processual.

2  – DA NECESSÁRIA DESCLASSIFICAÇÃO

O ACUSADO É MERO USUÁRIO  

Art. 28, DA LEI 11.343/2006

                                               Em que pese haver o Acusado ter confirmado em seu interrogatório, na fase inquisitória, que a droga lhe pertencia, o mesmo, no entanto, negou, com veemência, que a droga tivesse destinação para terceiros, nomeadamente com o propósito de tráfico (fls. 23/26).  Ademais, segundo os relatos obtidos no inquérito policial em liça, não há qualquer elemento que evidencie a prática do comércio de drogas, uma vez que não houve flagrante de venda, detenção de usuários, apreensão de objetos destinados à preparação, embalagem e pesagem da droga, etc. Em verdade, como se destaca da própria peça acusatória, o Acusado encontrava-se em seu veículo tão-somente trafegando em seu bairro, em direção à sua residência.

                                               A propósito, extrai-se do termo de depoimento do policial militar Joaquim da Silva das Tantas, na condição de condutor do flagrante(fls. 19/20):

“Que, no dia de hoje, por volta de 13:00h, o Depoente estava efetuando rondas de rotina, nas proximidades do bairro Fictício, quando deparou-se com o veículo Fiat, placas XXX-0000, o qual na ocasião era conduzido por Francisco Fictício; Que foi feita a abordagem do mencionado veículo na Avenida Y, em frente ao Mercadão Tal; Que Francisco Fictício, ao se deparar com a guarnição, empreendeu fuga no veículo ora descrito, junto com seu comparsa João Fictício; Que, conseguiram obstar o veículo na Av. X, onde foi feita revista pessoal em Francisco e com ele encontrada sua carteira de documentos pessoais e no interior da mesma, R$ 273,00 (duzentos e setenta e três reais) em dinheiro; Que realizada a busca no interior do veículo Fiat, foi encontrado próximo a alavanca de marchas, embaixo do console, sete pedras de substância aparentando ser “Crack”, as quais estavam acondicionadas em um plástico transparente; Que questionado sobre a droga o Conduzido informou que iria levar até sua casa, para consumir junto com João Fictício, que também encontrava-se no veículo. “

                                               O também policial militar Pedro das Tantas declarou no inquérito policial que:

“QUE, no dia de hoje, por volta de 13:00h, o Depoente estava efetuando rondas de rotina, juntamente com o Sd. Joaquim, nas proximidades do bairro Fictício, quando avistou o veículo Fiat, placas XXX-0000, na ocasião sendo dirigido por Francisco Fictício, encontrando-se ao seu lado João Fictício; Que ao avistar a guarnição, o Conduzido demonstrou nervosismo e acelerou o veículo, empreendendo fuga; Que nas proximidades da Avenida X, próximo a Farmácia Vida o veículo foi abordado; Que foi feita a revista pessoal em Francisco e com ele foi encontrada sua carteira de documentos pessoais e no interior da mesma, R$ 273,00(duzentos e setenta e três reais) em dinheiro; Que realizada a busca no interior do veículo, foi encontrado sete pedras de sustância aparentando ser “Crack”; Que questionado sobre a droga o Conduzido informou que iria levar até sua residência, para consumir junto com João Fictício, que na ocasião também fora preso com o mesmo; “

                                               Dessa forma, considerando-se os depoimentos dos aludidos policiais militares, não há, nem de longe, qualquer importe fático que conduza à figura do tráfico de drogas ilícitas, ao contrário do que aduz o Parquet.

                                               Leve-se em conta, de outro norte, que a destinação da droga apreendida era o de consumo em ambos os Acusados, tanto que João Fictício(“segundo Acusado”) declarou que(fls. 24/25):

“QUE, na data dos fatos solicitou a Francisco que fosse comprar pedras de “Crack” pra fumarem juntos; que o declarante fuma no cachimbo e o Francisco  fuma mesclado, ou seja, “crack” misturado com maconha; que quem pagou pela droga foi o declarante, dinheiro este que obtivera na venda de uma bicicleta; que o declarante sempre comprava droga para si e para Francisco, pois ambos são viciados; que a quantidade de droga que o denunciado adquiriu levaria cerca de dez dias para ser consumida pelo declarante e por Francisco; que o declarante trabalha em uma tipografia Zeta, e no horário da prisão estava fora de seu horário de trabalho, que encerra ao meio-dia; […] que perguntada se Francisco costumava ter dinheiro para comprar drogas o mesmo respondeu: que seu Francisco trabalha como Corretor de Imóveis na Imobiliária Xita, ganhando aproximadamente R$ 2.000,00(dois mil reais), quantia esta suficiente para manter o vício de ambos, que são amigos desde a infância.”

                                               Não obstante a peça acusatória destacar que os Acusados transportavam “considerada” quantidade de drogas, o que, em verdade, não o é, destaque-se que tal circunstância, isoladamente, não tem o condão de justificar a condenação pelo crime de tráfico de drogas, mormente pelo que dispõe o art. 28, §2º, da Lei n. 11.343/2006.  

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

( . . . )

§ 2º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

                                                           Ademais, a quantidade de droga apreendida, como salientado em todos os depoimentos colhidos, seria para uso de ambos os Acusados. Nem mesmo a quantia em dinheiro apreendida faz crer qualquer orientação que seja originária da venda de drogas. Outrossim, não houve sequer indícios, segundo os depoimentos colhidos, que os policiais tenham visto os Acusados efetuando a venda das pedras de “Crack”. Aliás, sequer outras pessoas haviam perto do local que tivessem a intenção de adquirir a droga.

                                               Ao comentar referido artigo, lecionam Luz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches Cunha e Wiliam Terra de Oliveira:

“Há dois sistemas legais para decidir se o agente (que está envolvido com a posse ou porte de droga) é usuário ou traficante: (a) sistema da quantificação legal (fixa-se, nesse caso, um quantum diário para o consumo pessoal; até esse limite legal não há que se falar em tráfico); (b) sistema do reconhecimento policial ou judicial (cabe ao juiz ou à autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico). A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deve fazer a distinção entre o usuário e o traficante.

É da tradição brasileira da lei brasileira a adoção do segundo critério (sistema do reconhecimento judicial ou policial). Cabe ao juiz (ou à autoridade policial) reconhecer se a droga encontrada era para destinação pessoal ou para o tráfico. Para isso a lei estabeleceu uma série enorme de critérios. Logo, não se trata de uma opinião do juiz ou de uma apreciação subjetiva. Os dados são objetivos. (…)

A lei nova estabeleceu uma série (enorme) de critérios para se descobrir se a droga destina-se (ou não) a consumo pessoal. São eles: natureza e a quantidade da substância apreendida, local e condições em que se desenvolveu a ação, circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente.

Em outras palavras, são relevantes: o objeto material do delito (natureza e quantidade da droga), o desvalor da ação (locais e condições em que ela se desenvolveu) assim como o próprio agente do fato (suas circunstâncias sociais e pessoas (sic), condutas e antecedentes).

É importante saber: se se trata de droga “pesada” (cocaína, heroína etc.) ou “leve” (maconha, v.g.); a quantidade dessa droga (assim como qual é o consumo diário possível); o local da apreensão (zona típica de tráfico ou não); as condições da prisão (local da prisão, local de trabalho do agente etc.); profissão do sujeito, antecedentes etc.

A quantidade da droga, por si só, não constitui, em regra, critério determinante. Claro que há situações inequívocas: uma tonelada de cocaína ou maconha revela traficância (destinação a terceiros). Há, entretanto, quantidades que não permitem uma conclusão definitiva. Daí a necessidade de não se valorar somente um critério (o quantitativo), senão todos os fixados na Lei. O modus vivendi do agente (ele vive do quê?) é um dado bastante expressivo. Qual a sua fonte de receita? Qual é sua profissão? Trabalha onde? Quais sinais exteriores de riqueza apresenta? Tudo isso conta para a correta definição jurídica do fato. Não faz muito tempo um ator de televisão famoso foi surpreendido comprando uma quantidade razoável de drogas. Aparentemente, pela quantidade, seria para tráfico. Depois se comprovou ex abundantia sua qualidade de usuário. Como se vê, tudo depende do caso concreto, da pessoa concreta, da droga que foi apreendida, quantidade etc. (Lei de drogas comentada. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 161/162)

                                                           Nesta mesma ordem de entendimento são as mais diversas decisões dos Tribunais:

TRÁFICO DE ENTORPECENTES. MERCANCIA NÃO DEMONSTRADA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. DESCLASSIFICAÇÃO. USUÁRIO. POSSIBILIDADE.

Existindo dúvidas a respeito da traficância e sendo pequena a quantidade de droga apreendida em poder do agente, a desclassificação do delito é medida que se impõe. (TJRO – APL 0005533-83.2012.8.22.0501; Relª Desª Ivanira Feitosa Borges; Julg. 14/02/2013; DJERO 26/02/2013; Pág. 56)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO PROFERIDO NOS ACLARATÓRIOS PELO STJ -NOVO JULGAMENTO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO NO DECISUM EXARADO NA APELAÇÃO CRIMINAL. DISCUSSÃO ACERCA DA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES PELO JUÍZO A QUO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO. PRINCÍPIO DO FAVOR REI. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE PORTE PARA USO. CONFISSÃO DO USO DA DROGA PELOS RÉUS. CIRCUSTÂNCIAS QUE NÃO COMPROVAM A MERCANCIA. SENTENÇA CONFIRMADA. FUNDAMENTOS QUE PASSAM A INTEGRAR O APELO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E PROVIDOS. DECISÃO UNÂNIME.

Considerando que estes empachos visam sanar vícios do acórdão proferido na apelação criminal, os quais foram detectados pelo Superior Tribunal de Justiça, obriga-se a análise dos pontos suscitados naquele apelo;. Não havendo provas suficientes de que os agentes praticavam o tráfico de drogas, deve-se afastar a condenação pleiteada pelo órgão acusatório, principalmente considerando as situações descritas nos autos em que não restou constatado serem os mesmos traficantes, em virtude das circunstâncias em que foram detidos;. Embargos de declaração providos. Unanimidade. (TJSE – EDcl 2010305356; Ac. 1285/2013; Câmara Criminal; Rel. Des. Netônio Bezerra Machado; DJSE 26/02/2013; Pág. 23)

APELAÇÃO. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. ENCONTRO DE PEQUENA QUANTIDADE DE MACONHA E DE CIGARROS PARCIALMENTE CONSUMIDOS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES À COMPROVAÇÃO DO TRÁFICO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA PORTE PARA CONSUMO PRÓPRIO.

Cabimento: Havendo dúvidas sobre a traficância, já que além das denúncias anônimas nenhum outro elemento de convicção foi trazido aos autos, cabível aceitar a alegação, feita pelo réu desde o início, de que tinha a droga consigo apenas para seu próprio consumo. Recurso parcialmente provido, para desclassificação da conduta. (TJSP – APL 0002571-58.2009.8.26.0444; Ac. 6438184; Pilar do Sul; Décima Quinta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. J. Martins; Julg. 13/12/2012; DJESP 26/02/2013)

APELAÇÃO CRIMINAL MINISTERIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A INFRAÇÃO DO ART. 28 DA LEI N. 11.343/06. ALMEJADA REFORMA DA SENTENÇA MONOCRÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS INSEGURAS QUANTO À TRAFICÂNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.

1. A deficiência probatória quanto aos atos de comércio afasta a certeza necessária para uma condenação. E tendo o réu alegado que é usuário de drogas, autorizada está a desclassificação para a conduta do art. 28 da Lei n. 11.343/06, em atenção ao princípio constitucional “in dubio pro reo”.

2. Recurso improvido. (TJMS – APL 0200666-92.2011.8.12.0043; São Gabriel do Oeste; Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Francisco Gerardo de Sousa; DJMS 25/02/2013; Pág. 27)                             

                                               Nesse diapasão, denota-se que os elementos de convicção de que dispõe o caderno processual mostram-se frágeis para atestar a prática da narcotraficância, conduzindo-se para a hipótese de que o Acusado se enquadra na figura do usuário, na estreita ordem delimitada no art. 28 da Lei n. 11.343/2006.

3 – QUANTO À IMPUTAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO  

INOCORRÊNCIA – AUSÊNCIA DE ANIMUS ASSOCIATIVO

Art. 35, CAPUT, DA LEI 11.343/2006

                                               Narra a denúncia, mais, que os Acusados associaram-se para o tráfico de drogas, quando “ambos”(os Acusados) teriam praticado o delito de vender drogas a terceiros, na forma do que reza o art. 35, caput, da Lei nº. 11.343/2006.  

                                               Não assiste razão ao Ministério Público, maiormente quando de toda imprecisa e absurda a narrativa fática contida na peça exordial.

                                               Ora, para que se cogite a conduta delitiva prevista no art. 35, caput, da Lei nº. 11.343/2006, faz-se mister que o quadro fático encontrado seja de sorte a demonstrar o ânimo associativo dos integrantes do delito em espécie. Desta feita, cabia ao Ministério Público evidenciar, com clareza e precisão, a eventual convergência de interesses dos Acusados em unirem-se para o tráfico, de modo estável e permanente.

                                                           Todos os depoimentos colhidos na fase inquisitória traduzem que os Acusados tão-somente compraram drogas para uso próprio, sem um terceiro ou outro propósito de traficar.

                                               Abordando o tema aqui trazido à baila, professa Luiz Flávio Gomes que :

“O art. 35 traz modalidade especial de quadrilha ou bando (art. 288 do CP). Contudo, diferentemente da quadrilha, a associação para o tráfico exige apenas duas pessoas (e não quatro), agrupadas de forma estável e permanente, para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput (tráfico de drogas), e 34 (tráfico de maquinário) desta Lei. […] Tipo Subjetivo – É o dolo (animus associativo), aliado ao fim específico de traficar drogas ou maquinário. […] ‘Para o reconhecimento do crime previsto no art. 14 da Lei 6.368/76 [atual 35], não basta a convergência de vontades para a prática das infrações constantes dos arts. 12 e 13 [atuais arts. 33 e 34]. É necessário, também, a intenção associativa com a finalidade de cometê-las, o dolo específico’ […]” (Lei de Drogas Comentada. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 204/205)

                                               Com a mesma sorte de entendimento leciona Guilherme de Souza Nucci que:

“Exige-se elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável. Do contrário, seria um mero concurso de agentes para a prática do crime de tráfico. Para a configuração do delito do art. 35 (antigo art. 14 da Lei 6.368/76) é fundamental que os ajustes se reúnam com o propósito de manter uma meta comum.” (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 6ª. ed. São Paulo: RT, 2012, vol. I, p. 273)”

                                                Para que se legitime a imposição da sanção correspondente pelo cometimento do delito em questão (art. 35), a lei exige mais do que o exercício do tráfico em integração pelos criminosos, porquanto em tal situação, a conduta de cada qual, sem um animusespecífico e duradouro de violar os arts. 33 e 34 da Lei de Tóxicos, evidencia, em tese, unicamente a co-autoria.

APELAÇÕES CRIMINAIS. LEI DE TÓXICOS. ARTS. 33, CAPUT, 33, § 1º, E 35, CAPUT, DA LEI, NA FORMA DO ART. 69 DO CP.

Nulidade da sentença. Descabimento. Inocorrência de vícios. Fixação da pena no patamar mínimo. Impossibilidade. Duas circunstâncias desabonadoras. Causa especial de diminuição do art. 4º do art. 33. Inaplicabilidade. Condenações anteriores transitadas em julgado. Materialidade do crime de tráfico. Farta prova pericial. Não caracterização do animus associativo. Ausência de prova robusta para configurar a associação para o tráfico. In dubio pro reo. Absolvição dos apelantes no tipo do art. 35. Conversão de pena, para restritiva de direitos. Não preenchimento de todos os requisitos do art. 44 do CP. Apelos conhecidos e parcialmente providos. (TJRR – ACr 0010.10.017078-5; Rel. Des. Mauro Campello; DJERR 27/02/2013; Pág. 20)

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE CRIMINAIS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ABSOLVIÇÃO. VIABILIDADE. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA SUSTENTAR UM DECRETO CONDENATÓRIO. PREVALÊNCIA DO VOTO MINORITÁRIO. ACÓRDÃO REFORMADO. SENTENÇA MANTIDA.

1. O crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/2006, exige, para a sua caracterização, a associação estável e permanente de dois ou mais agentes, agrupados com a finalidade de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos no artigo 33, ” caput” e § 1º, e artigo 34, do mesmo diploma legal.

2. Na hipótese, não havendo provas do animus associativo, de caráter estável e duradouro, entre os embargantes e os co-denunciados, viável o pleito absolutório quanto ao delito de associação para o tráfico.

3. Embargos infringentes e de nulidade criminais conhecidos e providos. (TJDF – Rec 2009.01.1.092113-2; Ac. 652.686; Câmara Criminal; Rel. Desig. Des. Jesuíno Rissato; DJDFTE 15/02/2013; Pág. 49)

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CONDENAÇÃO NOS TERMOS DO ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO. FIXAÇÃO DE REGIME PARA O CUMPRIMENTO DA PENA.

1 – Se os elementos informativos colhidos durante a fase inquisitorial e confirmados pelas provas jurisdicionalizadas são suficientes para comprovar a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06, a condenação é medida impositiva.

2. Não havendo provas que demonstrem a existência do animus associativo, ou seja, o ajuste prévio e duradouro entre os agentes para a prática de determinado crime de tráfico de drogas, a manutenção da absolvição pelo referido delito é medida impositiva.

3. Atendidos os requisitos descritos no artigo 44 e incisos do Código Penal, cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos para condenados por tráfico de drogas, porquanto a resolução n. 5, de 2012, do Senado Federal suspendeu a execução da expressão “vedada a conversão em pena restritivas de direitos” do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do supremo tribunal federal nos autos do habeas corpus nº 97.256/ RS.

4. Ante a aplicação da causa especial de diminuição da pena, descrita no artigo 33, § 4º, da Lei antidrogas e a substituição da reprimenda por restritivas de direitos, o regime de cumprimento da pena deve ser fixado no aberto em homenagem ao princípio da proporcionalidade.

5- recurso conhecido e parcialmente provido. (TJGO – ACr 33249-61.2011.8.09.0023; Caiapônia; Rel. Des. J. Paganucci Jr.; DJGO 11/01/2013; Pág. 393)

APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA EM RELAÇÃO AOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 33, CAPUT, E 35, DA LEI Nº 11.343/06 (SISTEMA NACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS). ALEGAÇÃO DE SUPOSTA FRAGILIDADE DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ARTIGOS 33, DA REFERIDA LEI. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

No caso dos autos, ausente o elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável, ou seja, não basta apenas a convergência de vontades, sendo necessária a intenção associativa para o tráfico de drogas, o que não restou comprovado. Para a caracterização do crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/06) é indispensável a existência do animus específico por parte dos envolvidos em se associarem para, reiteradamente ou não, praticarem o crime de tráfico. O dolo específico dos agentes tem que ser no sentido de formação de uma associação estável e permanente para o fim de tráfico, seja ele eventual ou reiterado. (TJSE – ACr 2011318760; Ac. 19196/2012; Câmara Criminal; Rel. Des. Luiz Antônio Araújo Mendonça; DJSE 08/01/2013; Pág. 21)

4 – DA NECESSIDADE DO EXAME DE DEPENDÊNCIA TOXICOLÓGICA

                                               Colhe-se do depoimento prestado pelo Acusado(fls. ) perante a Autoridade Policial, que o mesmo declarou-se viciado em droga, mais especificamente no “Crack”, droga esta que encontrava-se em seu poder para consumo.

                                               Tal droga inegavelmente diminui a capacidade de qualquer indivíduo entender o caráter ilícito da conduta ora apurada. E foi o caso do Acusado, o qual há anos é dependente químico desta droga e, por conta disto, já não mais reponde à sua capacidade intelectual e volitiva de obstar a utilização da droga. Resultou que esta incapacidade de dominar seus impulsos o fizesse a cometer o delito de usar a droga para satisfazer o impetro desenfreado de saciar este impulso.

                                               O Acusado não foi capaz, á época dos fatos narrados da denúncia, de minimamente compreender a ilicitude do consumo desta droga. Estava totalmente dominado e o campo cognitivo devastado pela nefasta droga do “Crack”.

                                               Não se questiona se o Acusado é ou não dependente. O que se busca com referida prova é: DEMONSTRAR QUE O MESMO ERA INIMPUTÁVEL, VISTO QUE ERA INCAPAZ DE VERIFICAR LUCIDAMENTE A ILICITUDE DO DELITO PERPETRADO.

                                                           Destarte, para que tal pleito não reste prejudicado pela preclusão, de logo o Acusado formula o pedido de produção de provas, qual seja o exame de dependência toxicológica, de sorte a provar que o Acusado não detinha à época dos fatos o completo entendimento da ilicitude perpetrada.

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. REALIZAÇÃO DE EXAME TOXICOLÓGICO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA.

1. Diz o art. 45 da Lei nº 11.343/06 ser isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 2. É certo que o pedido de diligências – no caso, realização de exame de dependência toxicológica – pode ser indeferido pelo Magistrado, desde que o faça em decisão devidamente motivada. 3. Na hipótese, carece de efetiva fundamentação a decisão do Juízo singular, principalmente diante dos elementos que evidenciam a necessidade da perícia. 4. Ordem concedida com o fim de anular o processo-crime originário, com a determinação de realização do exame de dependência toxicológica. (STJ – HC 118.320; Proc. 2008/0225433-2; DF; Sexta Turma; Rel. Des. Conv. Haroldo Rodrigues; Julg. 24/05/2011; DJE 08/09/2011)

EXAME DE DEPENDÊNCIA. Magistrada que não examina pedido de realização de exame de dependência toxicológica formulado tanto em defesa preliminar, em alegações finais, nem mesmo o mencionando no relatório da sentença. Réu que, em seu interrogatório, afirmou ser viciado em entorpecentes, tendo sido juntada documentação comprobatória de que já esteve internado para tratamento da dependência. Tema reavivado em sede de apelação. Necessidade de realização da perícia, que deve ser feita, sob a fiscalização das partes, na origem. Julgamento convertido em diligência. (TJSP – APL 993.08.001454-0; Ac. 4500836; Carapicuíba; Sexta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Ericson Maranho; Julg. 15/05/2008; DJESP 06/07/2010)

5  – DO PEDIDO DE “LIBERDADE PROVISÓRIA”

                                               De regra tem entendido alguns Tribunais que, quando tratar-se da hipótese de crime de tráfico de drogas, como o é a hipótese absurda ora imputada ao Acusado, a liberdade provisória há de ser negada, sob o ângulo do art. 44, caput, da Lei nº 11.343/06(Lei de Drogas) e, mais, para alguns, sob o manto do art. 5º, inc. XLIII, da Carta Magna.

                                               Um grande equívoco que, ademais, vem sendo reiteradamente alterado este raciocínio. Vejamos, a propósito, considerações acerca da impertinência daquelas decisões denegatórias da Liberdade Provisória, aos crimes ora em debate.

                                                           Saliente-se, primeiramente, que o Acusado é primário, de bons antecedentes, com ocupação lícita e residência fixa, o que, como provas, acostamos aos autos, ofuscando, pois, quaisquer dos parâmetros da segregação cautelar prevista no art. 312 da Legislação Adjetiva Penal.(docs. 01/05)

5.1. Regras de hermenêutica

– Conflito aparente de normas(antinomia)

– Um enfoque sob o ângulo do “Critério Cronológico

                                               Segundo as lições consagradas do ilustre e renomado jurista italiano Noberto Bobbio:

“                                  A situação de normas incompatíveis entre si é uma dificuldade tradicional frente à qual se encontraram os juristas de todos os tempos, e teve uma denominação própria: antinomia.

( . . . )

                                   Definimos antinomia como aquela situação na qual são colocadas em existência duas normas, das quais uma obriga e a outra permite, ou uma proíbe e a outra permite o mesmo comportamento.“(Bobbio, Noberto. Teoria do ordenamento jurídico. 4ª Ed. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1994. Pág. 81-86)

                                               Dentro do tema de antinomia de regras, com mais precisão sob o ensejo do critério da cronologia de regras, no tocante ao crime de tráfico de entorpecentes, já sob a vigência da Lei nº 8.072/90(Lei de Crimes Hediondos), existia comando legal de sorte a não permitir a concessão de liberdade provisória(art. 2º, inc. II), a qual fora reiterada pela Lei nº. 11.343/06(Lei de Drogas), em seu art. 44. Tal vedação fora suprimida, entrementes, pela Lei nº. 11.464, de 29 de março de 2007, que alterou o citado dispositivo da Lei nº. 8.072/90, deixando de existir a proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados, mas tão-somente tratando da fiança.

                                               É consabido que uma lei posterior, de mesma hierarquia, revoga(expressa ou tacitamente) a lei anterior, naquilo que for colidente.

                                               Novamente colhemos as lições de Noberto Bobbio, quando, sob o trato de colisão de leis no tempo, professa que:

“                                  As regras fundamentais para a solução de antinomias são três: a) o critério cronológico; b) o critério hierárquico; c) o critério da especialidade;

                                   O critério cronológico, chamado também de Lex posterior, é aquele com base no qual, entre duas normas incompatíveis, prevalece a norma posterior: Lex posterior derogat priori. Esse critério não necessita de comentário particular. Existe uma regra geral do Direito em que a vontade posterior revoga a precedente, e que de dois atos de vontade da mesma pessoa vale o último no tempo. Imagine-se a Lei como a expressão da vontade do legislador e não haverá dificuldade em justificar a regra. A regra contrária obstaria o progresso jurídico, a adaptação gradual do Direito às exigência sociais. Pensemos, por absurdo, nas conseqüências que derivariam da regra que prescrevesse ater-se à norma precedente. Além disso, presume-se que o legislador não queria fazer coisa inútil e sem finalidade: se devesse prevalecer a norma precedente, a lei sucessiva seria um ato inútil e sem finalidade. “( ob. e aut., cits., pág. 92-93).

                                               Na hipótese em estudo, como se percebe, uma lei geral posterior, in casu a Lei nº 11.464/2007, que trata dos crimes hediondos e equiparados, revogou uma lei anterior especial que trata do crime hediondo de tráfico de drogas(art. 44, da Lei 11.343/2006).

                                               Vejamos, mais, as colocações de Norberto Avena, quando, citando o pensamento do Professor Luis Flávio Gomes, destaca que:

1ª Posição: A Lei 11.464/2007, ao excluir dos crimes hediondos e equiparados a vedação à liberdade provisória, sendo posterior à nova Lei de Drogas, revogou, taticamente, o art. 44 desta lei que proibia o benefício aos crimes lá relacionados. Adepto deste entendimento, Luis Flávio Gomes utiliza o critério da cronologia das leis no tempo para concluir no sentido da prevalência da normatização inserta à Lei dos Crimes Hediondos. Refere, pois:

‘A Lei dos Crimes Hediondos(Lei 8.072/1990), em sua redação original, proibia, nesses crimes e nos equiprados, a concessão de liberdade provisória(essa é a liberdade que acontece logo após a prisão em flagrante, quando injustificada a prisão cautelar do sujeito). Tráfico de drogas sempre foi considerado crime equiparado(desde 1990). A mesma proibição foi reiterada na nova Lei de Drogas(Lei 11.343/2006), em seu art. 44. A partir de 08.10.2006(data em que entrou em vigor esta última lei), a proibição achava-se presente tanto na lei geral(Lei de Crimes Hediondos) como na lei especial(Lei de Drogas). Esse cenário foi completamente alterado com o advento da Lei 11.464/2007(vigente desde 29.03.07), que suprimiu a proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados(previa então no art. 2º, inciso II, da Lei 8.072/1990). Como se vê, houve uma sucessão de leis processuais materiais. O princípio regente (da posterioridade), destarte, é o seguinte: a lei posterior revoga a lei anterior(essa revogação, como sabemos, pode ser expressa ou tácita; no caso, a Lei 11.464/2007, que é geral, derrogou parte do art. 44 da Lei 11.343/2006, que é especial). Em outras palavras, desapareceu do citado art. 44 a proibição da liberdade provisória, porque a lei nova revogou (derrogou) a antiga, seja porque com ela é incompatível, seja porque cuidou inteiramente da matéria. “(Avena, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo Penal: Esquematizado. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2012. Pág. 975)

                                               Na mesma sorte de entendimento, vejamos o que leciona Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar:

“                                  a) Crimes hediondos e assemelhados(tráfico, tortura e terrorismo): estas infrações, como já relatado, não admitem a prestação de fiança(art. 5º, inc. XLIII, CF). Contudo, por força da Lei nº. 11.464/2007, alterando o art. 2º, inc. II, da Lei nº. 8.072/1990, passaram a admitir a liberdade provisória sem fiança.

                                   O interessante é que o crime de tortura, que é assemelhado a hediondo, já comportava liberdade provisória sem fiança, em razão do art. 1º, § 6º da Lei nº 9.455/1997.

                                   Já quanto ao tráfico de drogas, a questão exige bom senso. É que a Lei nº 11.343/2006, lei especial que disciplina o tráfico e condutas assemelhadas, no caput do art. 44 veda a fiança e a liberdade provisória sem fiança a tais infrações. Ora, mesmo sendo lei especial, acreditamos que houve revogação tácita com o advento da Lei nº 11.464/2007 alterando a lei de crimes hediondos. Se todos os hediondos e assemelhados comportam liberdade provisória sem fiança, o tráfico não foge à regra. A razoabilidade justifica a medida. Afinal, onde há a mesma razão, deve haver o mesmo direito. “(Távora, Nestor; Alencar, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ª Ed. Bahia: JusPodvm, 2012. Pág. 652)

                                                           Seguindo todas estas óticas supra evidenciadas, vejamos os seguintes julgados:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006). UTILIZAÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRISÃO EM FLAGRANTE, CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA OU DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO, COM BASE NA VEDAÇÃO LEGAL (ART. 44 DA LEI Nº 11.343/2006) E NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. MANIFESTA ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CONCESSÃO DA ORDEM, DE OFÍCIO.

I. Dispõe o art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal que será concedido habeas corpus “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”, não cabendo a sua utilização como substituto de recurso ordinário, tampouco de Recurso Especial, nem como sucedâneo da revisão criminal. II. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, recentemente, os HCs 109.956/PR (DJe de 11/09/2012) e 104.045/RJ (DJe de 06/09/2012), considerou inadequado o writ, para substituir recurso ordinário constitucional, em Habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, reafirmando que o remédio constitucional não pode ser utilizado, indistintamente, sob pena de banalizar o seu precípuo objetivo e desordenar a lógica recursal. III. O Superior Tribunal de Justiça também tem reforçado a necessidade de se cumprir as regras do sistema recursal vigente, sob pena de torná-lo inócuo e desnecessário (art. 105, II, a, e III, da CF/88), considerando o âmbito restrito do habeas corpus, previsto constitucionalmente, no que diz respeito ao STJ, sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, nas hipóteses do art. 105, I, c, e II, a, da Carta Magna. lV. Nada impede, contudo, que, na hipótese de habeas corpus substitutivo de recursos especial e ordinário ou de revisão criminal – que não merece conhecimento -, seja concedido habeas corpus, de ofício, em caso de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou decisão teratológica. V. Na hipótese, constata-se o constrangimento ilegal, na medida em que o benefício da liberdade provisória foi negado, convertida a prisão em flagrante em preventiva, com base, unicamente, na gravidade abstrata do delito e na vedação do art. 44 da Lei nº 11.343/2006, o que, de acordo com a atual jurisprudência do STJ, não se admite. Precedentes. VI. A vedação legal à concessão da liberdade provisória aos processados pelos delitos de tráfico de drogas, prevista no art. 44 da Lei nº 11.343/2006, foi, recentemente, declarada inconstitucional, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (HC 104.339/SP), incidentalmente. Informativo 665, do STF. VII. Habeas corpus não conhecido. VIII. Concedida a ordem, de ofício, para revogar a prisão preventiva, deferindo-se, ao paciente, o benefício da liberdade provisória, sem prejuízo da imposição, pelo Juízo de 1º Grau, de medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal. (STJ – HC 251.502; Proc. 2012/0169966-1; SP; Sexta Turma; Relª Minª Assusete Magalhães; Julg. 04/12/2012; DJE 18/12/2012)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ART. 44 DA LEI N. 11.343/2006. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. IMPOSSIBILIDADE DE O TRIBUNAL A QUO COMPLEMENTAR OS ARGUMENTOS DO DECRETO DE PRISÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. POUCA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA (2,71 G DE CRACK E 6,97 G DE MACONHA).

1. A prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão devidamente fundamentada e com base em dados concretos, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos do art. 312 e seguintes do Código de Processo Penal. 2. Na espécie, o Juízo a quo não trouxe nenhum elemento concreto que demonstrasse o preenchimento dos requisitos autorizadores da prisão cautelar, mas fez uso de ilações abstratas acerca da gravidade do delito, além de fundamentar a decisão na vedação legal à liberdade provisória prevista na Lei n. 11.343/2006. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n. 104.339/SP, declarou a inconstitucionalidade da expressão “e liberdade provisória”, constante do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência n. 665, de 7 a 11/5/2012, daquela Corte. 4. Novas razões aduzidas pelo Tribunal de origem para justificar a custódia cautelar, por ocasião do julgamento do writ originário, não suprem a falta de fundamentação observada no Decreto prisional. 5. Ordem concedida para deferir ao paciente a liberdade provisória, salvo prisão por outro motivo ou superveniência de fatos novos e concretos que autorizem a sua decretação. (STJ – HC 248.776; Proc. 2012/0148049-1; DF; Sexta Turma; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; Julg. 09/10/2012; DJE 30/11/2012)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. QUANTIDADE. 1,92 G DE MASSA LÍQUIDA DE COCAÍNA E 0,62 G DE MASSA LÍQUIDA DE MACONHA. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ART. 44 DA LEI N. 11.343/2006. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo do recurso ordinário previsto nos arts. 105, II, a, da Constituição Federal e 30 da Lei n. 8.038/1990, consoante atual entendimento adotado no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, que não têm mais admitido o habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso ou a revisão criminal, salvo em situações excepcionais. 2. No julgamento do HC n. 104.339/SP, em 10/5/2012, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência n. 665/STF, de 7 a 11/5/2012, o Supremo Tribunal Federal declarou, incidentalmente, a inconstitucionalidade de parte do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, que proibia a concessão de liberdade provisória nos crimes de tráfico de entorpecentes. 3. As instâncias ordinárias não indicaram fatos concretos aptos a justificar a segregação cautelar da paciente, estando as decisões fundamentadas simplesmente na gravidade abstrata do crime, o que configura nítido constrangimento ilegal. 4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para deferir a liberdade provisória à paciente. (STJ – HC 252.435; Proc. 2012/0178212-1; DF; Sexta Turma; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; Julg. 07/11/2012; DJE 26/11/2012)

5.2. Prisão em flagrante é prisão cautelar

–  O Acusado não ostenta quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do CPP

– Inescusável o deferimento do pedido de liberdade provisória

                                               De outro bordo, como nas linhas inaugurais deste tópico foram levantadas e demonstradas, o Acusado não ostenta quaisquer das hipóteses situadas no art. 312 da Legislação Adjetiva Penal, as quais, neste ponto, poderiam inviabilizar o pleito de liberdade provisória.

                                               Como se vê, o Acusado, antes negando a prática dos delitos que lhes restaram imputados pelo Parquet, demonstrou, nesta peça, acima, que é réu primário e de bons antecedentes, comprovando, mais, possuir residência fixa e ocupação lícita.

                                               Neste diapasão, mesmo em se tratando de crime de tráfico ilícito de drogas, à luz dos ditames contrários previstos no art. 44 da Lei de Drogas, o Acusado faz jus à liberdade provisória, sem a implicação de pagamento de fiança.   

                                               Não há nos autos, outrossim, quaisquer motivos que implique na decretação preventiva do Acusado.

                                               Vejamos, a propósito, julgados neste tocante:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DECISÃO QUE CONVERTE PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MEDIDAS CAUTELARES. SUFICIÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.

1. A simples referência à natureza do crime de tráfico de drogas ou à sua gravidade abstrata, fazendo apenas menção à “natureza do fato e das circunstâncias em que ele ocorreu”, e à condição pessoal dos pacientes, apontando abstratamente a necessidade de assegurar a conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da Lei Penal, sem apontamentos concretos das razões que se chegou a tal convencimento, não são suficientes para estear a prisão com o objetivo de assegurar a aplicação da Lei Penal e conveniência da instrução criminal; 2. Estando a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva ausente de fundamentação idônea, mas não demonstrando a contento os pacientes que preenchem os requisitos para auferirem a liberdade provisória, impõe-se a fixação de medidas cautelares alternativas à segregação provisória, devendo ser valorada sob o prisma da proporcionalidade, razoabilidade e adequabilidade. 3. Ordem concedida. (TJRO – HC 0011654-78.2012.8.22.0000; Relª Desª Marialva Henriques Daldegan; Julg. 09/01/2013; DJERO 11/01/2013; Pág. 64)

HABEAS CORPUS TRÁFICO DE DROGAS APREENSÃO DE 17,33 GRAMAS DE COCAÍNA. PLEITO VISANDO O DEFERIMENTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA ADMISSIBILIDADE. PACIENTE QUE É PRIMÁRIO, POSSUIDOR DE BONS ANTECEDENTES, RESIDÊNCIA FIXA E TRABALHO LÍCITO.

Necessidade da custódia para garantia da ordem pública não demonstrada Gravidade do crime que, por si só, não pode ensejar a manutenção da prisão cautelar Ausência de violência ou grave ameaça à pessoa no crime praticado Possibilidade da imposição das medidas cautelares. Concessão parcial da ordem, para que seja deferida a liberdade provisória em favor do paciente, com a imposição das medidas cautelares previstas nos incisos I e V, do artigo 319 do CPP Extensão dos benefícios a corré Jane Keli Cristina Roque. (TJSP – HC 0233440-86.2012.8.26.0000; Ac. 6423125; Orlândia; Décima Sexta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Borges Pereira; Julg. 18/12/2012; DJESP 11/01/2013)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA PREVISTOS NO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSISTÊNCIA DAS ASSERTIVAS. ANÁLISE DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA À LUZ DO DISPOSTO NO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECLARAÇÃO, PELO TRIBUNAL PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ACERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 44 DA LEI N. 11.343/06, NA PARTE QUE VEDAVA A LIBERDADE PROVISÓRIA AOS ACUSADOS DA PRÁTICA DO DELITO DE TRÁFICO. AFRONTA AO DISPOSTO NO INCISO IX DO ART. 93 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE SUSTENTADA NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. DECISÃO QUE NÃO INDICA ELEMENTOS FÁTICOS E CONCRETOS QUE DEMONSTREM A INDISPENSABILIDADE DA CLAUSURA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. – CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA.

O plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, na parte que vedava a liberdade provisória aos acusados pela prática do crime de tráfico de substância entorpecente, razão pela qual revela-se necessária a análise do pedido de liberdade dos acusados pela prática do delito de tráfico de drogas à luz dos requisitos do art. 312 do código de processo penal. A decisão que mantém a custódia cautelar deve ser fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do código de processo penal, quais sejam, a garantia da ordem pública, ordem econômica, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da Lei penal, conjugadas com a novel redação do art. 313 do mesmo CODEX, demonstradas por meio de elementos concretos, tendo em vista que apenas o embasamento genérico acerca da gravidade abstrata do crime e do risco à ordem pública, não são motivos suficientes para a imposição da custódia cautelar, sob pena de violar o princípio da presunção da não culpabilidade e o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Ordem concedida. (TJMT – HC  133345/2012; Terceira Câmara Criminal; Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva; Julg. 12/12/2012; DJMT 10/01/2013; Pág. 102)

6 – EM CONCLUSÃO

6.1. Liberdade Provisória

                                               Em face dos fundamentos legais, doutrinários e jurisprudenciais amplamente citados nesta peça vestibular de defesa, requer-se, sob o abrigo no art. 310, parágrafo único, do Código de Processo Penal, seja-lhe concedida a LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, expedindo-se, para tanto, o devido ALVARÁ DE SOLTURA, com a entrega do Acusado, ora preso, de forma incontinenti, o que de logo requer.

6.2. No âmago da defesa

                                               O Acusado, urge asseverar, jamais traficou drogas, não sendo a hipótese dos autos a ilicitude imputada pelo Ministério Público de delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006.

                                                  Em verdade, a droga apreendida era para uso próprio devendo o Acusado, se condenado, ser absolvido das condutas previstas no art. 33, caput  c/c 35, caput, da Lei n. 11.343/2006, desclassificando para crime do art. 28 da referida lei(porte e consumo próprio) e, subsidiariamente, caso assim não entenda Vossa Excelência, conceder a causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, maiormente quando entendido que a quantidade de drogas(pela defesa entendida como ínfima), considerada isoladamente, não impede a incidência da referida minorante.

                                                  Protesta provar o alegado por toda forma de direito admitido, notadamente pela produção de prova testemunhal(cujo rol segue abaixo) e pelo exame de dependência química.

Nestes termos,

Pede deferimento

Cidade, 00 de janeiro de 2018.

NOME ADVOGADO

OAB/UF 00.000

ROL DE TESTEMUNHAS(art. 55, § 1º, da Lei 11.343/2006)

1) Fulano de tal,

2)

3)

4)

5)

                                               Data supra.

Sobre o Autor: GETULIO GEDIEL DOS SANTOS, é advogado inscrito na OAB/MT, formado pela Unic – Universidade de Cuiabá, Unidade de Sinop, atuante desde fevereiro/2013, e com escritório localizado na Cidade de Sinop/MT, com prática voltada para as áreas Cíveis, Criminais, Família e Empresarial.

Verifique sempre a vigência das leis indicadas, a jurisprudência local e os riscos de improcedência. Limitações de uso: Você NÃO PODE revender, divulgar, distribuir ou publicar o conteúdo abaixo, mesmo que gratuitamente, exceto para fins diretamente ligados ao processo do seu cliente final. Ao utilizar este documento você concorda com os nossos Termos de uso.

Aviso legal: Este é um modelo inicial que deve ser adaptado ao caso concreto por profissional habilitado.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DA CIDADE (UF).

Rito Especial

Tipo penal: Art. 33, caput c/c art. 35 da Lei 11.343/2006

[ Formula-se pedido de “liberdade provisória, sem fiança ]

Proc. nº.  7777.33.2222.5.06.4444

Autor: Ministério Público Estadual

Acusados: Nome XXXXX

                                                Intermediado por seu mandatário ao final firmado, causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, sob o nº. 112233, comparece o Acusado para, na forma do art. 55, § 1º, da Lei Federal nº. 11.343/2006 c/c art. 394, § 2º, da Legislação Adjetiva Penal, tempestivamente, no decêndio legal, oferecer sua

DEFESA PRELIMINAR,

( com pedido de “liberdade provisória”)

quanto à pretensão condenatória ostentada em desfavor de FRANCISCO FICTÍCIO e outro, já qualificados na exordial da peça acusatória, consoante abaixo delineado.

1 – SÍNTESE DOS FATOS  

                                                O Acusado, juntamente com João Fictício, foram denunciados pelo Ministério Público Estadual, em xx de abril do ano de yyyy, como incurso no tipo penal previsto nos arts. 33 c/c art. 35 da Lei Federal nº. 11.343/2006, pela suposta prática das condutas delituosas abaixo descritas.

                                               Segundo a peça acusatória, na tarde do dia xx de março de yyyy, por volta das 13:00h, integrantes da Polícia Militar lotados na 00ª Companhia do 00º Batalhão desta Capital, realizavam rondas de rotina nas proximidades do bairro fictício. Em dado momento, avistaram o veículo marca Fiat, placas XXX-0000, conduzido pelo ora acusado, o qual, quando avistou a guarnição, acelerou o veículo empreendendo fuga do local

                                               Diante disto, os Soldados da citada guarnição procederam imediata perseguição e, nas proximidades da Av. X, na altura do número 1122(em frente a Farmácia Vida), conseguiram obstar o veículo. Ato seguinte, procederam a devida abordagem no automóvel ora mencionado, realizando também revista pessoal em ambos os Acusados, logrando encontrar com o primeiro Acusado a quantia de R$ 273,00(duzentos e setenta e três reais) em dinheiro.(auto de exibição e apreensão de fls. 14).

                                               Ato contínuo, foi realizada revista no automóvel do ora Acusado e em seu interior foram apreendidas “7(sete) pedras de substância, aparentando ser ´crack´, pesando 60(sessenta) gramas, acondicionadas em uma embalagem de plástico transparente.”(termo de exibição e apreensão de fls. 15). Segundo o laudo de pericial de constatação de fls. 14/17, tratam-se de pedras de substância identificada como tóxica, popularmente denominada de “crack”, com reação positiva para cocaína.

                                                           Assim procedendo, diz a denúncia, os Acusados violaram norma protetiva da saúde pública, tratando-se de delito de perigo abstrato para toda a coletividade, tendo em seu poder/transportando, com intuito de comércio ou venda, substância entorpecente que determina a dependência física e/ou psíquica, cuja utilização encontra-se proibida em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

                                               Diante disto, os Acusados foram flagranteados naquela mesma data, pela violação dos comandos legais estipulados na presente peça processual.

2  – DA NECESSÁRIA DESCLASSIFICAÇÃO

O ACUSADO É MERO USUÁRIO  

Art. 28, DA LEI 11.343/2006

                                               Em que pese haver o Acusado ter confirmado em seu interrogatório, na fase inquisitória, que a droga lhe pertencia, o mesmo, no entanto, negou, com veemência, que a droga tivesse destinação para terceiros, nomeadamente com o propósito de tráfico (fls. 23/26).  Ademais, segundo os relatos obtidos no inquérito policial em liça, não há qualquer elemento que evidencie a prática do comércio de drogas, uma vez que não houve flagrante de venda, detenção de usuários, apreensão de objetos destinados à preparação, embalagem e pesagem da droga, etc. Em verdade, como se destaca da própria peça acusatória, o Acusado encontrava-se em seu veículo tão-somente trafegando em seu bairro, em direção à sua residência.

                                               A propósito, extrai-se do termo de depoimento do policial militar Joaquim da Silva das Tantas, na condição de condutor do flagrante(fls. 19/20):

“Que, no dia de hoje, por volta de 13:00h, o Depoente estava efetuando rondas de rotina, nas proximidades do bairro Fictício, quando deparou-se com o veículo Fiat, placas XXX-0000, o qual na ocasião era conduzido por Francisco Fictício; Que foi feita a abordagem do mencionado veículo na Avenida Y, em frente ao Mercadão Tal; Que Francisco Fictício, ao se deparar com a guarnição, empreendeu fuga no veículo ora descrito, junto com seu comparsa João Fictício; Que, conseguiram obstar o veículo na Av. X, onde foi feita revista pessoal em Francisco e com ele encontrada sua carteira de documentos pessoais e no interior da mesma, R$ 273,00 (duzentos e setenta e três reais) em dinheiro; Que realizada a busca no interior do veículo Fiat, foi encontrado próximo a alavanca de marchas, embaixo do console, sete pedras de substância aparentando ser “Crack”, as quais estavam acondicionadas em um plástico transparente; Que questionado sobre a droga o Conduzido informou que iria levar até sua casa, para consumir junto com João Fictício, que também encontrava-se no veículo. “

                                               O também policial militar Pedro das Tantas declarou no inquérito policial que:

“QUE, no dia de hoje, por volta de 13:00h, o Depoente estava efetuando rondas de rotina, juntamente com o Sd. Joaquim, nas proximidades do bairro Fictício, quando avistou o veículo Fiat, placas XXX-0000, na ocasião sendo dirigido por Francisco Fictício, encontrando-se ao seu lado João Fictício; Que ao avistar a guarnição, o Conduzido demonstrou nervosismo e acelerou o veículo, empreendendo fuga; Que nas proximidades da Avenida X, próximo a Farmácia Vida o veículo foi abordado; Que foi feita a revista pessoal em Francisco e com ele foi encontrada sua carteira de documentos pessoais e no interior da mesma, R$ 273,00(duzentos e setenta e três reais) em dinheiro; Que realizada a busca no interior do veículo, foi encontrado sete pedras de sustância aparentando ser “Crack”; Que questionado sobre a droga o Conduzido informou que iria levar até sua residência, para consumir junto com João Fictício, que na ocasião também fora preso com o mesmo; “

                                               Dessa forma, considerando-se os depoimentos dos aludidos policiais militares, não há, nem de longe, qualquer importe fático que conduza à figura do tráfico de drogas ilícitas, ao contrário do que aduz o Parquet.

                                               Leve-se em conta, de outro norte, que a destinação da droga apreendida era o de consumo em ambos os Acusados, tanto que João Fictício(“segundo Acusado”) declarou que(fls. 24/25):

“QUE, na data dos fatos solicitou a Francisco que fosse comprar pedras de “Crack” pra fumarem juntos; que o declarante fuma no cachimbo e o Francisco  fuma mesclado, ou seja, “crack” misturado com maconha; que quem pagou pela droga foi o declarante, dinheiro este que obtivera na venda de uma bicicleta; que o declarante sempre comprava droga para si e para Francisco, pois ambos são viciados; que a quantidade de droga que o denunciado adquiriu levaria cerca de dez dias para ser consumida pelo declarante e por Francisco; que o declarante trabalha em uma tipografia Zeta, e no horário da prisão estava fora de seu horário de trabalho, que encerra ao meio-dia; […] que perguntada se Francisco costumava ter dinheiro para comprar drogas o mesmo respondeu: que seu Francisco trabalha como Corretor de Imóveis na Imobiliária Xita, ganhando aproximadamente R$ 2.000,00(dois mil reais), quantia esta suficiente para manter o vício de ambos, que são amigos desde a infância.”

                                               Não obstante a peça acusatória destacar que os Acusados transportavam “considerada” quantidade de drogas, o que, em verdade, não o é, destaque-se que tal circunstância, isoladamente, não tem o condão de justificar a condenação pelo crime de tráfico de drogas, mormente pelo que dispõe o art. 28, §2º, da Lei n. 11.343/2006.  

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

( . . . )

§ 2º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

                                                           Ademais, a quantidade de droga apreendida, como salientado em todos os depoimentos colhidos, seria para uso de ambos os Acusados. Nem mesmo a quantia em dinheiro apreendida faz crer qualquer orientação que seja originária da venda de drogas. Outrossim, não houve sequer indícios, segundo os depoimentos colhidos, que os policiais tenham visto os Acusados efetuando a venda das pedras de “Crack”. Aliás, sequer outras pessoas haviam perto do local que tivessem a intenção de adquirir a droga.

                                               Ao comentar referido artigo, lecionam Luz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches Cunha e Wiliam Terra de Oliveira:

“Há dois sistemas legais para decidir se o agente (que está envolvido com a posse ou porte de droga) é usuário ou traficante: (a) sistema da quantificação legal (fixa-se, nesse caso, um quantum diário para o consumo pessoal; até esse limite legal não há que se falar em tráfico); (b) sistema do reconhecimento policial ou judicial (cabe ao juiz ou à autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico). A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deve fazer a distinção entre o usuário e o traficante.

É da tradição brasileira da lei brasileira a adoção do segundo critério (sistema do reconhecimento judicial ou policial). Cabe ao juiz (ou à autoridade policial) reconhecer se a droga encontrada era para destinação pessoal ou para o tráfico. Para isso a lei estabeleceu uma série enorme de critérios. Logo, não se trata de uma opinião do juiz ou de uma apreciação subjetiva. Os dados são objetivos. (…)

A lei nova estabeleceu uma série (enorme) de critérios para se descobrir se a droga destina-se (ou não) a consumo pessoal. São eles: natureza e a quantidade da substância apreendida, local e condições em que se desenvolveu a ação, circunstâncias sociais e pessoais, bem como a conduta e os antecedentes do agente.

Em outras palavras, são relevantes: o objeto material do delito (natureza e quantidade da droga), o desvalor da ação (locais e condições em que ela se desenvolveu) assim como o próprio agente do fato (suas circunstâncias sociais e pessoas (sic), condutas e antecedentes).

É importante saber: se se trata de droga “pesada” (cocaína, heroína etc.) ou “leve” (maconha, v.g.); a quantidade dessa droga (assim como qual é o consumo diário possível); o local da apreensão (zona típica de tráfico ou não); as condições da prisão (local da prisão, local de trabalho do agente etc.); profissão do sujeito, antecedentes etc.

A quantidade da droga, por si só, não constitui, em regra, critério determinante. Claro que há situações inequívocas: uma tonelada de cocaína ou maconha revela traficância (destinação a terceiros). Há, entretanto, quantidades que não permitem uma conclusão definitiva. Daí a necessidade de não se valorar somente um critério (o quantitativo), senão todos os fixados na Lei. O modus vivendi do agente (ele vive do quê?) é um dado bastante expressivo. Qual a sua fonte de receita? Qual é sua profissão? Trabalha onde? Quais sinais exteriores de riqueza apresenta? Tudo isso conta para a correta definição jurídica do fato. Não faz muito tempo um ator de televisão famoso foi surpreendido comprando uma quantidade razoável de drogas. Aparentemente, pela quantidade, seria para tráfico. Depois se comprovou ex abundantia sua qualidade de usuário. Como se vê, tudo depende do caso concreto, da pessoa concreta, da droga que foi apreendida, quantidade etc. (Lei de drogas comentada. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 161/162)

                                                           Nesta mesma ordem de entendimento são as mais diversas decisões dos Tribunais:

TRÁFICO DE ENTORPECENTES. MERCANCIA NÃO DEMONSTRADA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. DESCLASSIFICAÇÃO. USUÁRIO. POSSIBILIDADE.

Existindo dúvidas a respeito da traficância e sendo pequena a quantidade de droga apreendida em poder do agente, a desclassificação do delito é medida que se impõe. (TJRO – APL 0005533-83.2012.8.22.0501; Relª Desª Ivanira Feitosa Borges; Julg. 14/02/2013; DJERO 26/02/2013; Pág. 56)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO PROFERIDO NOS ACLARATÓRIOS PELO STJ -NOVO JULGAMENTO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO NO DECISUM EXARADO NA APELAÇÃO CRIMINAL. DISCUSSÃO ACERCA DA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES PELO JUÍZO A QUO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO. PRINCÍPIO DO FAVOR REI. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE PORTE PARA USO. CONFISSÃO DO USO DA DROGA PELOS RÉUS. CIRCUSTÂNCIAS QUE NÃO COMPROVAM A MERCANCIA. SENTENÇA CONFIRMADA. FUNDAMENTOS QUE PASSAM A INTEGRAR O APELO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E PROVIDOS. DECISÃO UNÂNIME.

Considerando que estes empachos visam sanar vícios do acórdão proferido na apelação criminal, os quais foram detectados pelo Superior Tribunal de Justiça, obriga-se a análise dos pontos suscitados naquele apelo;. Não havendo provas suficientes de que os agentes praticavam o tráfico de drogas, deve-se afastar a condenação pleiteada pelo órgão acusatório, principalmente considerando as situações descritas nos autos em que não restou constatado serem os mesmos traficantes, em virtude das circunstâncias em que foram detidos;. Embargos de declaração providos. Unanimidade. (TJSE – EDcl 2010305356; Ac. 1285/2013; Câmara Criminal; Rel. Des. Netônio Bezerra Machado; DJSE 26/02/2013; Pág. 23)

APELAÇÃO. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. ENCONTRO DE PEQUENA QUANTIDADE DE MACONHA E DE CIGARROS PARCIALMENTE CONSUMIDOS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES À COMPROVAÇÃO DO TRÁFICO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA PORTE PARA CONSUMO PRÓPRIO.

Cabimento: Havendo dúvidas sobre a traficância, já que além das denúncias anônimas nenhum outro elemento de convicção foi trazido aos autos, cabível aceitar a alegação, feita pelo réu desde o início, de que tinha a droga consigo apenas para seu próprio consumo. Recurso parcialmente provido, para desclassificação da conduta. (TJSP – APL 0002571-58.2009.8.26.0444; Ac. 6438184; Pilar do Sul; Décima Quinta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. J. Martins; Julg. 13/12/2012; DJESP 26/02/2013)

APELAÇÃO CRIMINAL MINISTERIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A INFRAÇÃO DO ART. 28 DA LEI N. 11.343/06. ALMEJADA REFORMA DA SENTENÇA MONOCRÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS INSEGURAS QUANTO À TRAFICÂNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.

1. A deficiência probatória quanto aos atos de comércio afasta a certeza necessária para uma condenação. E tendo o réu alegado que é usuário de drogas, autorizada está a desclassificação para a conduta do art. 28 da Lei n. 11.343/06, em atenção ao princípio constitucional “in dubio pro reo”.

2. Recurso improvido. (TJMS – APL 0200666-92.2011.8.12.0043; São Gabriel do Oeste; Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Francisco Gerardo de Sousa; DJMS 25/02/2013; Pág. 27)                             

                                               Nesse diapasão, denota-se que os elementos de convicção de que dispõe o caderno processual mostram-se frágeis para atestar a prática da narcotraficância, conduzindo-se para a hipótese de que o Acusado se enquadra na figura do usuário, na estreita ordem delimitada no art. 28 da Lei n. 11.343/2006.

3 – QUANTO À IMPUTAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO  

INOCORRÊNCIA – AUSÊNCIA DE ANIMUS ASSOCIATIVO

Art. 35, CAPUT, DA LEI 11.343/2006

                                               Narra a denúncia, mais, que os Acusados associaram-se para o tráfico de drogas, quando “ambos”(os Acusados) teriam praticado o delito de vender drogas a terceiros, na forma do que reza o art. 35, caput, da Lei nº. 11.343/2006.  

                                               Não assiste razão ao Ministério Público, maiormente quando de toda imprecisa e absurda a narrativa fática contida na peça exordial.

                                               Ora, para que se cogite a conduta delitiva prevista no art. 35, caput, da Lei nº. 11.343/2006, faz-se mister que o quadro fático encontrado seja de sorte a demonstrar o ânimo associativo dos integrantes do delito em espécie. Desta feita, cabia ao Ministério Público evidenciar, com clareza e precisão, a eventual convergência de interesses dos Acusados em unirem-se para o tráfico, de modo estável e permanente.

                                                           Todos os depoimentos colhidos na fase inquisitória traduzem que os Acusados tão-somente compraram drogas para uso próprio, sem um terceiro ou outro propósito de traficar.

                                               Abordando o tema aqui trazido à baila, professa Luiz Flávio Gomes que :

“O art. 35 traz modalidade especial de quadrilha ou bando (art. 288 do CP). Contudo, diferentemente da quadrilha, a associação para o tráfico exige apenas duas pessoas (e não quatro), agrupadas de forma estável e permanente, para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput (tráfico de drogas), e 34 (tráfico de maquinário) desta Lei. […] Tipo Subjetivo – É o dolo (animus associativo), aliado ao fim específico de traficar drogas ou maquinário. […] ‘Para o reconhecimento do crime previsto no art. 14 da Lei 6.368/76 [atual 35], não basta a convergência de vontades para a prática das infrações constantes dos arts. 12 e 13 [atuais arts. 33 e 34]. É necessário, também, a intenção associativa com a finalidade de cometê-las, o dolo específico’ […]” (Lei de Drogas Comentada. 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 204/205)

                                               Com a mesma sorte de entendimento leciona Guilherme de Souza Nucci que:

“Exige-se elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável. Do contrário, seria um mero concurso de agentes para a prática do crime de tráfico. Para a configuração do delito do art. 35 (antigo art. 14 da Lei 6.368/76) é fundamental que os ajustes se reúnam com o propósito de manter uma meta comum.” (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 6ª. ed. São Paulo: RT, 2012, vol. I, p. 273)”

                                                Para que se legitime a imposição da sanção correspondente pelo cometimento do delito em questão (art. 35), a lei exige mais do que o exercício do tráfico em integração pelos criminosos, porquanto em tal situação, a conduta de cada qual, sem um animusespecífico e duradouro de violar os arts. 33 e 34 da Lei de Tóxicos, evidencia, em tese, unicamente a co-autoria.

APELAÇÕES CRIMINAIS. LEI DE TÓXICOS. ARTS. 33, CAPUT, 33, § 1º, E 35, CAPUT, DA LEI, NA FORMA DO ART. 69 DO CP.

Nulidade da sentença. Descabimento. Inocorrência de vícios. Fixação da pena no patamar mínimo. Impossibilidade. Duas circunstâncias desabonadoras. Causa especial de diminuição do art. 4º do art. 33. Inaplicabilidade. Condenações anteriores transitadas em julgado. Materialidade do crime de tráfico. Farta prova pericial. Não caracterização do animus associativo. Ausência de prova robusta para configurar a associação para o tráfico. In dubio pro reo. Absolvição dos apelantes no tipo do art. 35. Conversão de pena, para restritiva de direitos. Não preenchimento de todos os requisitos do art. 44 do CP. Apelos conhecidos e parcialmente providos. (TJRR – ACr 0010.10.017078-5; Rel. Des. Mauro Campello; DJERR 27/02/2013; Pág. 20)

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE CRIMINAIS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ABSOLVIÇÃO. VIABILIDADE. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA SUSTENTAR UM DECRETO CONDENATÓRIO. PREVALÊNCIA DO VOTO MINORITÁRIO. ACÓRDÃO REFORMADO. SENTENÇA MANTIDA.

1. O crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/2006, exige, para a sua caracterização, a associação estável e permanente de dois ou mais agentes, agrupados com a finalidade de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos no artigo 33, ” caput” e § 1º, e artigo 34, do mesmo diploma legal.

2. Na hipótese, não havendo provas do animus associativo, de caráter estável e duradouro, entre os embargantes e os co-denunciados, viável o pleito absolutório quanto ao delito de associação para o tráfico.

3. Embargos infringentes e de nulidade criminais conhecidos e providos. (TJDF – Rec 2009.01.1.092113-2; Ac. 652.686; Câmara Criminal; Rel. Desig. Des. Jesuíno Rissato; DJDFTE 15/02/2013; Pág. 49)

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CONDENAÇÃO NOS TERMOS DO ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITO. FIXAÇÃO DE REGIME PARA O CUMPRIMENTO DA PENA.

1 – Se os elementos informativos colhidos durante a fase inquisitorial e confirmados pelas provas jurisdicionalizadas são suficientes para comprovar a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06, a condenação é medida impositiva.

2. Não havendo provas que demonstrem a existência do animus associativo, ou seja, o ajuste prévio e duradouro entre os agentes para a prática de determinado crime de tráfico de drogas, a manutenção da absolvição pelo referido delito é medida impositiva.

3. Atendidos os requisitos descritos no artigo 44 e incisos do Código Penal, cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos para condenados por tráfico de drogas, porquanto a resolução n. 5, de 2012, do Senado Federal suspendeu a execução da expressão “vedada a conversão em pena restritivas de direitos” do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006, declarada inconstitucional por decisão definitiva do supremo tribunal federal nos autos do habeas corpus nº 97.256/ RS.

4. Ante a aplicação da causa especial de diminuição da pena, descrita no artigo 33, § 4º, da Lei antidrogas e a substituição da reprimenda por restritivas de direitos, o regime de cumprimento da pena deve ser fixado no aberto em homenagem ao princípio da proporcionalidade.

5- recurso conhecido e parcialmente provido. (TJGO – ACr 33249-61.2011.8.09.0023; Caiapônia; Rel. Des. J. Paganucci Jr.; DJGO 11/01/2013; Pág. 393)

APELAÇÃO CRIMINAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA EM RELAÇÃO AOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTIGOS 33, CAPUT, E 35, DA LEI Nº 11.343/06 (SISTEMA NACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS). ALEGAÇÃO DE SUPOSTA FRAGILIDADE DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS EM RELAÇÃO AO DELITO PREVISTO NO ARTIGOS 33, DA REFERIDA LEI. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

No caso dos autos, ausente o elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável, ou seja, não basta apenas a convergência de vontades, sendo necessária a intenção associativa para o tráfico de drogas, o que não restou comprovado. Para a caracterização do crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/06) é indispensável a existência do animus específico por parte dos envolvidos em se associarem para, reiteradamente ou não, praticarem o crime de tráfico. O dolo específico dos agentes tem que ser no sentido de formação de uma associação estável e permanente para o fim de tráfico, seja ele eventual ou reiterado. (TJSE – ACr 2011318760; Ac. 19196/2012; Câmara Criminal; Rel. Des. Luiz Antônio Araújo Mendonça; DJSE 08/01/2013; Pág. 21)

4 – DA NECESSIDADE DO EXAME DE DEPENDÊNCIA TOXICOLÓGICA

                                               Colhe-se do depoimento prestado pelo Acusado(fls. ) perante a Autoridade Policial, que o mesmo declarou-se viciado em droga, mais especificamente no “Crack”, droga esta que encontrava-se em seu poder para consumo.

                                               Tal droga inegavelmente diminui a capacidade de qualquer indivíduo entender o caráter ilícito da conduta ora apurada. E foi o caso do Acusado, o qual há anos é dependente químico desta droga e, por conta disto, já não mais reponde à sua capacidade intelectual e volitiva de obstar a utilização da droga. Resultou que esta incapacidade de dominar seus impulsos o fizesse a cometer o delito de usar a droga para satisfazer o impetro desenfreado de saciar este impulso.

                                               O Acusado não foi capaz, á época dos fatos narrados da denúncia, de minimamente compreender a ilicitude do consumo desta droga. Estava totalmente dominado e o campo cognitivo devastado pela nefasta droga do “Crack”.

                                               Não se questiona se o Acusado é ou não dependente. O que se busca com referida prova é: DEMONSTRAR QUE O MESMO ERA INIMPUTÁVEL, VISTO QUE ERA INCAPAZ DE VERIFICAR LUCIDAMENTE A ILICITUDE DO DELITO PERPETRADO.

                                                           Destarte, para que tal pleito não reste prejudicado pela preclusão, de logo o Acusado formula o pedido de produção de provas, qual seja o exame de dependência toxicológica, de sorte a provar que o Acusado não detinha à época dos fatos o completo entendimento da ilicitude perpetrada.

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. REALIZAÇÃO DE EXAME TOXICOLÓGICO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA.

1. Diz o art. 45 da Lei nº 11.343/06 ser isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. 2. É certo que o pedido de diligências – no caso, realização de exame de dependência toxicológica – pode ser indeferido pelo Magistrado, desde que o faça em decisão devidamente motivada. 3. Na hipótese, carece de efetiva fundamentação a decisão do Juízo singular, principalmente diante dos elementos que evidenciam a necessidade da perícia. 4. Ordem concedida com o fim de anular o processo-crime originário, com a determinação de realização do exame de dependência toxicológica. (STJ – HC 118.320; Proc. 2008/0225433-2; DF; Sexta Turma; Rel. Des. Conv. Haroldo Rodrigues; Julg. 24/05/2011; DJE 08/09/2011)

EXAME DE DEPENDÊNCIA. Magistrada que não examina pedido de realização de exame de dependência toxicológica formulado tanto em defesa preliminar, em alegações finais, nem mesmo o mencionando no relatório da sentença. Réu que, em seu interrogatório, afirmou ser viciado em entorpecentes, tendo sido juntada documentação comprobatória de que já esteve internado para tratamento da dependência. Tema reavivado em sede de apelação. Necessidade de realização da perícia, que deve ser feita, sob a fiscalização das partes, na origem. Julgamento convertido em diligência. (TJSP – APL 993.08.001454-0; Ac. 4500836; Carapicuíba; Sexta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Ericson Maranho; Julg. 15/05/2008; DJESP 06/07/2010)

5  – DO PEDIDO DE “LIBERDADE PROVISÓRIA”

                                               De regra tem entendido alguns Tribunais que, quando tratar-se da hipótese de crime de tráfico de drogas, como o é a hipótese absurda ora imputada ao Acusado, a liberdade provisória há de ser negada, sob o ângulo do art. 44, caput, da Lei nº 11.343/06(Lei de Drogas) e, mais, para alguns, sob o manto do art. 5º, inc. XLIII, da Carta Magna.

                                               Um grande equívoco que, ademais, vem sendo reiteradamente alterado este raciocínio. Vejamos, a propósito, considerações acerca da impertinência daquelas decisões denegatórias da Liberdade Provisória, aos crimes ora em debate.

                                                           Saliente-se, primeiramente, que o Acusado é primário, de bons antecedentes, com ocupação lícita e residência fixa, o que, como provas, acostamos aos autos, ofuscando, pois, quaisquer dos parâmetros da segregação cautelar prevista no art. 312 da Legislação Adjetiva Penal.(docs. 01/05)

5.1. Regras de hermenêutica

– Conflito aparente de normas(antinomia)

– Um enfoque sob o ângulo do “Critério Cronológico

                                               Segundo as lições consagradas do ilustre e renomado jurista italiano Noberto Bobbio:

“                                  A situação de normas incompatíveis entre si é uma dificuldade tradicional frente à qual se encontraram os juristas de todos os tempos, e teve uma denominação própria: antinomia.

( . . . )

                                   Definimos antinomia como aquela situação na qual são colocadas em existência duas normas, das quais uma obriga e a outra permite, ou uma proíbe e a outra permite o mesmo comportamento.“(Bobbio, Noberto. Teoria do ordenamento jurídico. 4ª Ed. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1994. Pág. 81-86)

                                               Dentro do tema de antinomia de regras, com mais precisão sob o ensejo do critério da cronologia de regras, no tocante ao crime de tráfico de entorpecentes, já sob a vigência da Lei nº 8.072/90(Lei de Crimes Hediondos), existia comando legal de sorte a não permitir a concessão de liberdade provisória(art. 2º, inc. II), a qual fora reiterada pela Lei nº. 11.343/06(Lei de Drogas), em seu art. 44. Tal vedação fora suprimida, entrementes, pela Lei nº. 11.464, de 29 de março de 2007, que alterou o citado dispositivo da Lei nº. 8.072/90, deixando de existir a proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados, mas tão-somente tratando da fiança.

                                               É consabido que uma lei posterior, de mesma hierarquia, revoga(expressa ou tacitamente) a lei anterior, naquilo que for colidente.

                                               Novamente colhemos as lições de Noberto Bobbio, quando, sob o trato de colisão de leis no tempo, professa que:

“                                  As regras fundamentais para a solução de antinomias são três: a) o critério cronológico; b) o critério hierárquico; c) o critério da especialidade;

                                   O critério cronológico, chamado também de Lex posterior, é aquele com base no qual, entre duas normas incompatíveis, prevalece a norma posterior: Lex posterior derogat priori. Esse critério não necessita de comentário particular. Existe uma regra geral do Direito em que a vontade posterior revoga a precedente, e que de dois atos de vontade da mesma pessoa vale o último no tempo. Imagine-se a Lei como a expressão da vontade do legislador e não haverá dificuldade em justificar a regra. A regra contrária obstaria o progresso jurídico, a adaptação gradual do Direito às exigência sociais. Pensemos, por absurdo, nas conseqüências que derivariam da regra que prescrevesse ater-se à norma precedente. Além disso, presume-se que o legislador não queria fazer coisa inútil e sem finalidade: se devesse prevalecer a norma precedente, a lei sucessiva seria um ato inútil e sem finalidade. “( ob. e aut., cits., pág. 92-93).

                                               Na hipótese em estudo, como se percebe, uma lei geral posterior, in casu a Lei nº 11.464/2007, que trata dos crimes hediondos e equiparados, revogou uma lei anterior especial que trata do crime hediondo de tráfico de drogas(art. 44, da Lei 11.343/2006).

                                               Vejamos, mais, as colocações de Norberto Avena, quando, citando o pensamento do Professor Luis Flávio Gomes, destaca que:

1ª Posição: A Lei 11.464/2007, ao excluir dos crimes hediondos e equiparados a vedação à liberdade provisória, sendo posterior à nova Lei de Drogas, revogou, taticamente, o art. 44 desta lei que proibia o benefício aos crimes lá relacionados. Adepto deste entendimento, Luis Flávio Gomes utiliza o critério da cronologia das leis no tempo para concluir no sentido da prevalência da normatização inserta à Lei dos Crimes Hediondos. Refere, pois:

‘A Lei dos Crimes Hediondos(Lei 8.072/1990), em sua redação original, proibia, nesses crimes e nos equiprados, a concessão de liberdade provisória(essa é a liberdade que acontece logo após a prisão em flagrante, quando injustificada a prisão cautelar do sujeito). Tráfico de drogas sempre foi considerado crime equiparado(desde 1990). A mesma proibição foi reiterada na nova Lei de Drogas(Lei 11.343/2006), em seu art. 44. A partir de 08.10.2006(data em que entrou em vigor esta última lei), a proibição achava-se presente tanto na lei geral(Lei de Crimes Hediondos) como na lei especial(Lei de Drogas). Esse cenário foi completamente alterado com o advento da Lei 11.464/2007(vigente desde 29.03.07), que suprimiu a proibição da liberdade provisória nos crimes hediondos e equiparados(previa então no art. 2º, inciso II, da Lei 8.072/1990). Como se vê, houve uma sucessão de leis processuais materiais. O princípio regente (da posterioridade), destarte, é o seguinte: a lei posterior revoga a lei anterior(essa revogação, como sabemos, pode ser expressa ou tácita; no caso, a Lei 11.464/2007, que é geral, derrogou parte do art. 44 da Lei 11.343/2006, que é especial). Em outras palavras, desapareceu do citado art. 44 a proibição da liberdade provisória, porque a lei nova revogou (derrogou) a antiga, seja porque com ela é incompatível, seja porque cuidou inteiramente da matéria. “(Avena, Norberto Cláudio Pâncaro. Processo Penal: Esquematizado. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2012. Pág. 975)

                                               Na mesma sorte de entendimento, vejamos o que leciona Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar:

“                                  a) Crimes hediondos e assemelhados(tráfico, tortura e terrorismo): estas infrações, como já relatado, não admitem a prestação de fiança(art. 5º, inc. XLIII, CF). Contudo, por força da Lei nº. 11.464/2007, alterando o art. 2º, inc. II, da Lei nº. 8.072/1990, passaram a admitir a liberdade provisória sem fiança.

                                   O interessante é que o crime de tortura, que é assemelhado a hediondo, já comportava liberdade provisória sem fiança, em razão do art. 1º, § 6º da Lei nº 9.455/1997.

                                   Já quanto ao tráfico de drogas, a questão exige bom senso. É que a Lei nº 11.343/2006, lei especial que disciplina o tráfico e condutas assemelhadas, no caput do art. 44 veda a fiança e a liberdade provisória sem fiança a tais infrações. Ora, mesmo sendo lei especial, acreditamos que houve revogação tácita com o advento da Lei nº 11.464/2007 alterando a lei de crimes hediondos. Se todos os hediondos e assemelhados comportam liberdade provisória sem fiança, o tráfico não foge à regra. A razoabilidade justifica a medida. Afinal, onde há a mesma razão, deve haver o mesmo direito. “(Távora, Nestor; Alencar, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ª Ed. Bahia: JusPodvm, 2012. Pág. 652)

                                                           Seguindo todas estas óticas supra evidenciadas, vejamos os seguintes julgados:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006). UTILIZAÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRISÃO EM FLAGRANTE, CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PEDIDO DE REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA OU DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO, COM BASE NA VEDAÇÃO LEGAL (ART. 44 DA LEI Nº 11.343/2006) E NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. MANIFESTA ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CONCESSÃO DA ORDEM, DE OFÍCIO.

I. Dispõe o art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal que será concedido habeas corpus “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”, não cabendo a sua utilização como substituto de recurso ordinário, tampouco de Recurso Especial, nem como sucedâneo da revisão criminal. II. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, recentemente, os HCs 109.956/PR (DJe de 11/09/2012) e 104.045/RJ (DJe de 06/09/2012), considerou inadequado o writ, para substituir recurso ordinário constitucional, em Habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, reafirmando que o remédio constitucional não pode ser utilizado, indistintamente, sob pena de banalizar o seu precípuo objetivo e desordenar a lógica recursal. III. O Superior Tribunal de Justiça também tem reforçado a necessidade de se cumprir as regras do sistema recursal vigente, sob pena de torná-lo inócuo e desnecessário (art. 105, II, a, e III, da CF/88), considerando o âmbito restrito do habeas corpus, previsto constitucionalmente, no que diz respeito ao STJ, sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, nas hipóteses do art. 105, I, c, e II, a, da Carta Magna. lV. Nada impede, contudo, que, na hipótese de habeas corpus substitutivo de recursos especial e ordinário ou de revisão criminal – que não merece conhecimento -, seja concedido habeas corpus, de ofício, em caso de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou decisão teratológica. V. Na hipótese, constata-se o constrangimento ilegal, na medida em que o benefício da liberdade provisória foi negado, convertida a prisão em flagrante em preventiva, com base, unicamente, na gravidade abstrata do delito e na vedação do art. 44 da Lei nº 11.343/2006, o que, de acordo com a atual jurisprudência do STJ, não se admite. Precedentes. VI. A vedação legal à concessão da liberdade provisória aos processados pelos delitos de tráfico de drogas, prevista no art. 44 da Lei nº 11.343/2006, foi, recentemente, declarada inconstitucional, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (HC 104.339/SP), incidentalmente. Informativo 665, do STF. VII. Habeas corpus não conhecido. VIII. Concedida a ordem, de ofício, para revogar a prisão preventiva, deferindo-se, ao paciente, o benefício da liberdade provisória, sem prejuízo da imposição, pelo Juízo de 1º Grau, de medidas cautelares alternativas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal. (STJ – HC 251.502; Proc. 2012/0169966-1; SP; Sexta Turma; Relª Minª Assusete Magalhães; Julg. 04/12/2012; DJE 18/12/2012)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ART. 44 DA LEI N. 11.343/2006. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. IMPOSSIBILIDADE DE O TRIBUNAL A QUO COMPLEMENTAR OS ARGUMENTOS DO DECRETO DE PRISÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. POUCA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA (2,71 G DE CRACK E 6,97 G DE MACONHA).

1. A prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão devidamente fundamentada e com base em dados concretos, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos do art. 312 e seguintes do Código de Processo Penal. 2. Na espécie, o Juízo a quo não trouxe nenhum elemento concreto que demonstrasse o preenchimento dos requisitos autorizadores da prisão cautelar, mas fez uso de ilações abstratas acerca da gravidade do delito, além de fundamentar a decisão na vedação legal à liberdade provisória prevista na Lei n. 11.343/2006. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n. 104.339/SP, declarou a inconstitucionalidade da expressão “e liberdade provisória”, constante do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência n. 665, de 7 a 11/5/2012, daquela Corte. 4. Novas razões aduzidas pelo Tribunal de origem para justificar a custódia cautelar, por ocasião do julgamento do writ originário, não suprem a falta de fundamentação observada no Decreto prisional. 5. Ordem concedida para deferir ao paciente a liberdade provisória, salvo prisão por outro motivo ou superveniência de fatos novos e concretos que autorizem a sua decretação. (STJ – HC 248.776; Proc. 2012/0148049-1; DF; Sexta Turma; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; Julg. 09/10/2012; DJE 30/11/2012)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. QUANTIDADE. 1,92 G DE MASSA LÍQUIDA DE COCAÍNA E 0,62 G DE MASSA LÍQUIDA DE MACONHA. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. ART. 44 DA LEI N. 11.343/2006. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO STF. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.

1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo do recurso ordinário previsto nos arts. 105, II, a, da Constituição Federal e 30 da Lei n. 8.038/1990, consoante atual entendimento adotado no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, que não têm mais admitido o habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso ou a revisão criminal, salvo em situações excepcionais. 2. No julgamento do HC n. 104.339/SP, em 10/5/2012, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência n. 665/STF, de 7 a 11/5/2012, o Supremo Tribunal Federal declarou, incidentalmente, a inconstitucionalidade de parte do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, que proibia a concessão de liberdade provisória nos crimes de tráfico de entorpecentes. 3. As instâncias ordinárias não indicaram fatos concretos aptos a justificar a segregação cautelar da paciente, estando as decisões fundamentadas simplesmente na gravidade abstrata do crime, o que configura nítido constrangimento ilegal. 4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício, para deferir a liberdade provisória à paciente. (STJ – HC 252.435; Proc. 2012/0178212-1; DF; Sexta Turma; Rel. Min. Sebastião Reis Júnior; Julg. 07/11/2012; DJE 26/11/2012)

5.2. Prisão em flagrante é prisão cautelar

–  O Acusado não ostenta quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do CPP

– Inescusável o deferimento do pedido de liberdade provisória

                                               De outro bordo, como nas linhas inaugurais deste tópico foram levantadas e demonstradas, o Acusado não ostenta quaisquer das hipóteses situadas no art. 312 da Legislação Adjetiva Penal, as quais, neste ponto, poderiam inviabilizar o pleito de liberdade provisória.

                                               Como se vê, o Acusado, antes negando a prática dos delitos que lhes restaram imputados pelo Parquet, demonstrou, nesta peça, acima, que é réu primário e de bons antecedentes, comprovando, mais, possuir residência fixa e ocupação lícita.

                                               Neste diapasão, mesmo em se tratando de crime de tráfico ilícito de drogas, à luz dos ditames contrários previstos no art. 44 da Lei de Drogas, o Acusado faz jus à liberdade provisória, sem a implicação de pagamento de fiança.   

                                               Não há nos autos, outrossim, quaisquer motivos que implique na decretação preventiva do Acusado.

                                               Vejamos, a propósito, julgados neste tocante:

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DECISÃO QUE CONVERTE PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MEDIDAS CAUTELARES. SUFICIÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.

1. A simples referência à natureza do crime de tráfico de drogas ou à sua gravidade abstrata, fazendo apenas menção à “natureza do fato e das circunstâncias em que ele ocorreu”, e à condição pessoal dos pacientes, apontando abstratamente a necessidade de assegurar a conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da Lei Penal, sem apontamentos concretos das razões que se chegou a tal convencimento, não são suficientes para estear a prisão com o objetivo de assegurar a aplicação da Lei Penal e conveniência da instrução criminal; 2. Estando a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva ausente de fundamentação idônea, mas não demonstrando a contento os pacientes que preenchem os requisitos para auferirem a liberdade provisória, impõe-se a fixação de medidas cautelares alternativas à segregação provisória, devendo ser valorada sob o prisma da proporcionalidade, razoabilidade e adequabilidade. 3. Ordem concedida. (TJRO – HC 0011654-78.2012.8.22.0000; Relª Desª Marialva Henriques Daldegan; Julg. 09/01/2013; DJERO 11/01/2013; Pág. 64)

HABEAS CORPUS TRÁFICO DE DROGAS APREENSÃO DE 17,33 GRAMAS DE COCAÍNA. PLEITO VISANDO O DEFERIMENTO DA LIBERDADE PROVISÓRIA ADMISSIBILIDADE. PACIENTE QUE É PRIMÁRIO, POSSUIDOR DE BONS ANTECEDENTES, RESIDÊNCIA FIXA E TRABALHO LÍCITO.

Necessidade da custódia para garantia da ordem pública não demonstrada Gravidade do crime que, por si só, não pode ensejar a manutenção da prisão cautelar Ausência de violência ou grave ameaça à pessoa no crime praticado Possibilidade da imposição das medidas cautelares. Concessão parcial da ordem, para que seja deferida a liberdade provisória em favor do paciente, com a imposição das medidas cautelares previstas nos incisos I e V, do artigo 319 do CPP Extensão dos benefícios a corré Jane Keli Cristina Roque. (TJSP – HC 0233440-86.2012.8.26.0000; Ac. 6423125; Orlândia; Décima Sexta Câmara de Direito Criminal; Rel. Des. Borges Pereira; Julg. 18/12/2012; DJESP 11/01/2013)

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DA PRISÃO PREVENTIVA PREVISTOS NO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSISTÊNCIA DAS ASSERTIVAS. ANÁLISE DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA À LUZ DO DISPOSTO NO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECLARAÇÃO, PELO TRIBUNAL PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ACERCA DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 44 DA LEI N. 11.343/06, NA PARTE QUE VEDAVA A LIBERDADE PROVISÓRIA AOS ACUSADOS DA PRÁTICA DO DELITO DE TRÁFICO. AFRONTA AO DISPOSTO NO INCISO IX DO ART. 93 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE SUSTENTADA NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. DECISÃO QUE NÃO INDICA ELEMENTOS FÁTICOS E CONCRETOS QUE DEMONSTREM A INDISPENSABILIDADE DA CLAUSURA PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. – CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA.

O plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, na parte que vedava a liberdade provisória aos acusados pela prática do crime de tráfico de substância entorpecente, razão pela qual revela-se necessária a análise do pedido de liberdade dos acusados pela prática do delito de tráfico de drogas à luz dos requisitos do art. 312 do código de processo penal. A decisão que mantém a custódia cautelar deve ser fundamentada em quaisquer das hipóteses previstas no art. 312 do código de processo penal, quais sejam, a garantia da ordem pública, ordem econômica, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da Lei penal, conjugadas com a novel redação do art. 313 do mesmo CODEX, demonstradas por meio de elementos concretos, tendo em vista que apenas o embasamento genérico acerca da gravidade abstrata do crime e do risco à ordem pública, não são motivos suficientes para a imposição da custódia cautelar, sob pena de violar o princípio da presunção da não culpabilidade e o inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Ordem concedida. (TJMT – HC  133345/2012; Terceira Câmara Criminal; Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva; Julg. 12/12/2012; DJMT 10/01/2013; Pág. 102)

6 – EM CONCLUSÃO

6.1. Liberdade Provisória

                                               Em face dos fundamentos legais, doutrinários e jurisprudenciais amplamente citados nesta peça vestibular de defesa, requer-se, sob o abrigo no art. 310, parágrafo único, do Código de Processo Penal, seja-lhe concedida a LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, expedindo-se, para tanto, o devido ALVARÁ DE SOLTURA, com a entrega do Acusado, ora preso, de forma incontinenti, o que de logo requer.

6.2. No âmago da defesa

                                               O Acusado, urge asseverar, jamais traficou drogas, não sendo a hipótese dos autos a ilicitude imputada pelo Ministério Público de delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006.

                                                  Em verdade, a droga apreendida era para uso próprio devendo o Acusado, se condenado, ser absolvido das condutas previstas no art. 33, caput  c/c 35, caput, da Lei n. 11.343/2006, desclassificando para crime do art. 28 da referida lei(porte e consumo próprio) e, subsidiariamente, caso assim não entenda Vossa Excelência, conceder a causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, maiormente quando entendido que a quantidade de drogas(pela defesa entendida como ínfima), considerada isoladamente, não impede a incidência da referida minorante.

                                                  Protesta provar o alegado por toda forma de direito admitido, notadamente pela produção de prova testemunhal(cujo rol segue abaixo) e pelo exame de dependência química.

Nestes termos,

Pede deferimento

Cidade, 00 de janeiro de 2018.

NOME ADVOGADO

OAB/UF 00.000

ROL DE TESTEMUNHAS(art. 55, § 1º, da Lei 11.343/2006)

1) Fulano de tal,

2)

3)

4)

5)

                                               Data supra.

Sobre o Autor: GETULIO GEDIEL DOS SANTOS, é advogado inscrito na OAB/MT, formado pela Unic – Universidade de Cuiabá, Unidade de Sinop, atuante desde fevereiro/2013, e com escritório localizado na Cidade de Sinop/MT, com prática voltada para as áreas Cíveis, Criminais, Família e Empresarial.

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