Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito do Núcleo de Audiência de Custódia do Tribunal de Justiça do Estado do __.
Referência: Autos do Inquérito Policial nº / 2021.
O Delegado de Polícia Civil que ao final subscreve, no exercício dos poderes conferidos pelo artigo 144 da Constituição Federal, com fulcro nos artigos 311, 312 e 313, todos do Código de Processo Penal, diante dos fatos apurados no caderno investigatório em epígrafe vem à presença de Vossa Excelência, representar pela conversão da prisão em flagrante em preventiva de X, já qualificado, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:
I – Dos Fatos (relatório).
Trata-se de inquérito policial instaurado a partir de auto de prisão em flagrante para apuração dos crimes roubo majorado pelo concurso de agentes e emprego de arma de fogo, extorsão com restrição de liberdade, resistência e disparo de arma de fogo, fatos praticados por X, já qualificado e Y, no dia 19/01/2021. Os crimes contra o patrimônio foram praticados contra o casal A e B. Na fuga, os criminosos efetuaram disparos de arma de fogo contra os policiais militares, que figuram no auto de prisão em flagrante como condutor e testemunha. X foi preso, sendo que Y conseguiu deixar o banco do carona do veículo e fugir, não sendo encontrado. A bolsa e o dinheiro de Júlia bem como o aparelho de telefone celular de A foram recuperados e restituídos na Unidade Policial. A arma de fogo usada na senda criminosa não foi apreendida. Assim que a Autoridade Policial dispuser de mais elementos de informação serão elaboradas as representações cabíveis em relação à prisão de Y e à apreensão da arma de fogo.
II – Do Direito
No Processo Civil, os requisitos para uma ação cautelar são os seguintes: o fumus boni juris e o periculum in mora. Eles mostram que para ocorrer a prestação jurisdicional antecipada, o juiz tem de se convencer de que há a “fumaça do bom direito” e o “perigo da demora”. No Processo Penal, vários doutrinadores fizeram uma analogia diante dos institutos mencionados, para se mostrar como eles funcionariam neste ramo do Direito. Em matéria de prisão preventiva devem estar presentes os seguintes requisitos: fumus comissi delicti e o periculum libertatis.
No fumus comissi delicti (pressupostos) deve haver a existência de crime e indícios de autoria. No caso em tela, temos a comprovação da existência dos delitos narrados por conta dos termos de apreensão e restituição dos bens das vítimas, além da viatura militar alvejada.
Para haver o periculum libertatis é necessária a presença de um dos seguintes fundamentos: a garantia da ordem pública, a garantia da ordem econômica, a aplicação da lei penal e a conveniência da instrução criminal.
No caso em comento, o autor, x, foi reconhecido por A e B como autor dos crimes contra o patrimônio. Ele também foi reconhecido por uma terceira vítima, como autor do roubo do veículo, que fora usado nos crimes que acarretaram sua prisão, automóvel descrito na ocorrência nº 01234/21, fato ocorrido no dia 15/01/2021. A Autoridade Policial que ao final subscreve já determinou a extração de cópias do presente para instauração de outro inquérito policial para apuração de roubo do automóvel.
Assim, presentes os pressupostos e fundamentos da prisão preventiva, imperativo se revela a segregação cautelar do representado, para se garantir a ordem pública e principalmente a credibilidade da Justiça.
O Princípio da Atualidade, inserido no Código de Processo Penal com o Pacote Anticrime, e que está relacionado com a “provisionalidade”, diz que para que uma prisão preventiva seja decretada, é necessário que o periculum libertatis seja atual, presente, não passado e tampouco futuro e incerto. A “atualidade do perigo” é elemento fundante da “natureza” cautelar.
Como se vislumbra pela leitura do auto de prisão em flagrante, o indiciado continua sua empreita criminosa.
O art. 311 do Código de Processo Penal, que dispõe sobre o momento da persecução penal em que é possível a decretação da prisão preventiva, e quais são os legitimados para o requerimento ou representação da detenção cautelar em comento, teve a redação alterada pela Lei Anticrime:
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019).
De antemão, verifica-se que o legislador suprimiu a expressão de “ofício” do dispositivo em comento, impossibilitando que o Magistrado decrete a prisão preventiva sem provocação dos legitimados.
Antes de adentrarmos no assunto, cumpre ressaltar que o art. 310 do CPP também sofreu alterações provocadas pela Lei Anticrime:
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
I – relaxar a prisão ilegal; ou (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
(…)
§ 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
(…)
Pela leitura dos autos, verifica-se que X ostenta três condenações por roubo com trânsito em julgado, o que o torna reincidente, fazendo com que Vossa Excelência não possa conceder a liberdade provisória com ou sem fiança, modalidade conhecida como proibida ou negada, apesar da imensa maioria da doutrina sustentar sua inconstitucionalidade.
Vale lembrar que a Lei 12.403/11 já havia alterado o art. 311 do CPP, possibilitando que o Juiz decretasse de ofício a prisão preventiva apenas no curso da ação penal, impedindo-o de decretá-la, sem provocação do legitimado, no curso do inquérito policial.
Diante das alterações promovidas pela Lei Anticrime nos arts. 310 e 311 do CPP, o Delegado de Polícia, que presidiu o auto de prisão em flagrante, ou o Órgão Ministerial, com atribuição para oficiar no feito, devem, respectivamente, representar ou requerer a prisão preventiva do indiciado, uma vez que o Juiz, que preside a audiência de custódia, está impedido de decretá-la de ofício, ou seja, sem a provocação dos legitimados.
Em um primeiro momento, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que era possível a conversão pelo juiz, de ofício, do flagrante em prisão preventiva, porém o entendimento foi alterado mais recentemente.
A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no HC nº 590039,
alterou entendimento e anulou a conversão de ofício da prisão em flagrante para preventiva
O Ministro do STF Edson Fachin concedeu “writ” de “habeas corpus” a um homem que teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, sem que o juiz fosse provocado por um dos legitimados, no HC 193.053 – MG.
Tendo em vista que Vossa Excelência não pode decretar de ofício a prisão preventiva, o Delegado de Polícia vem representar pela conversão do flagrante em preventiva.
III – Do pedido
Diante das razões de fato e de direito expostas, a Autoridade Policial ao final firmada representa pela conversão da prisão em flagrante de X em prisão preventiva de, com encaminhamento dos autos devidamente relatados no prazo legal, a contar do dia em que se executar a ordem de prisão.
Local, data, ano.
Delegado de Polícia Civil
Matrícula nº _