HABEAS CORPUS_TRÁFICO;PRIMÁRIO_PRIVILEGIADO_REVOGAÇÃO PREVENTIVA

EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) DESEMBARGADOR (A) PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Paciente: Nome do Preso Completo

Impetrante: Edimar Ferreira Gomes

Impetrado: M.MJuíz (a) de Direito do Foro da 99ª Vara Criminal da Comarca São Paulo –SP

EDIMAR FERREIRA GOMES, brasileiro, solteiro, advogado, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo, sob o nº 340.866, vêm, perante esse Egrégio Tribunal, nos termos do artigo , inciso LXVIII da Constituição Federal de 1.988 e artigos 647 e seguintes, do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de

HABEAS CORPUS

com pedido de Liminar

em favor de;

NOME DO PRESO COMPLETO, brasileiro, solteiro, RG nº 9999999 SSP/SP, CPF/MF nº 999.999.999-99 , residente e domiciliado no Endereço: Rua XXXXXXXXXXXXXXXXX, nº 99, Centro, CEP 99999-999, Bairro xxxxxx, São Paulo – SP; contra ato de coação ilegal coatora da liberdade do MM. Juíz (a) de Direito da 99ª Vara Criminal do Foro da Comarca de São Paulo –SP, (autos nº: 9999999-99.2020.8.26.0050), pelos motivos que passa a expor;

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

COLENDA CÂMARA,

INCLITO DES. (A) RELATOR (A),

DOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA.

I –DOS FATOS

O Paciente, foi preso em flagrante em 99 de novembro de 2020, e denunciado em 99 de dezembro 2020, pelo suposto crime de tráfico ilegal de drogas, apreendido o ínfimo de 7,3 e item 2,6 gramas de cocaína, conforme laudo de constatação (fls;), artigo 33, “caput”, da Lei nº 11.343/2006, fatos ocorridos por volta de 11h30min, na Rua xxxxxxxxxxxxxxx, altura nº xxx, Bairro xxxxx, São Paulo –SP., conduzido ao Distrito Policial, São Paulo –SP, e encontra-se recolhido no Centro de Detenção Provisória, São Paulo –SP, sob a matrícula SAP nº xxxxxxxxx.

Comunicado ao r.juízo,  a prisão em flagrante foi convertida em preventiva, sendo indeferido o pedido de liberdade provisória da defesa, pelo (a) juiz (a) da vara plantão audiência custódia em 99/99/2020 e negada revogação preventiva, sendo mantida a prisão cárcere, pelo juiz (a) da 99ª vara criminal da capital -SP, sob os mesmos fundamentos, do indiciado não comprovação de residência fixa e ocupação lícita, gravidade do delito e nocividade das drogas encontradas em seu poder.

Contudo, com o devido respeito e acatamento, não agiu com total acerto o nobre Magistrado. Vejamos:

II –DO DIREITO 

a) Da Revogação Da Prisão Preventiva

A decisão que homologou a prisão em flagrante pelo crime de tráfico de drogas considerou como presentes as condições para impor a restrição da liberdade de uma pessoa primária, com bons antecedentes, surpreendida com pequena quantidade de cocaína.

Contudo, a decisão do MM. Juízo em nada se adequa ao posicionamento consolidado no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, que por julgados recentes de sua Quinta Turma, já acenou mudanças para adequar-se ao entendimento do STF.

Assim, diferentemente da decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva, o presente habeas corpus conta com robusto suporte jurisprudencial, o que evidencia o constrangimento ilegal perpetuado pela decisão.

O fumus comissi delicti consiste na exigência que o CPP impõe para a decretação da prisão preventiva quanto à probabilidade razoável da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

Os elementos constantes nos autos de prisão em flagrante denotam que o paciente não pode ser enquadrado como incurso num crime de tráfico de drogas. A pequena quantidade de drogas é categórica nesse sentido .

Há que se ressaltar ainda alguns aspectos da situação descrita nos autos de prisão em flagrante. Não existem testemunhas, senão os próprios policiais responsáveis pela prisão. As palavras dos policiais, portanto, são os únicos “elementos de convicção” do douto magistrado para a comprovação de uma situação de tráfico de drogas.

Nesse sentido, imperioso citar os dizeres do Ministro Gilmar Mendes, que ressalta e critica essa prática costumeira e normalmente aceita pelo Poder Judiciário dando destaque às prisões em flagrante dos crimes de “tráfico” de drogas, em seu voto no julgamento do RE 635.659/SP:

O padrão de abordagem é quase sempre o mesmo: atitude suspeita, busca pessoal, pequena quantidade de droga e alguma quantia em dinheiro. Daí pra frente, o sistema repressivo passa a funcionar de acordo com o que o policial relatar no auto de flagrante , já que a sua palavra será, na maioria das vezes, a única prova contra o acusado. (…) No caso das prisões em flagrante, a situação é particularmente grave. Como já dito, o enquadramento jurídico é feito pela autoridade policial, com base, principalmente, na palavra dos policiais condutores. A palavra e a avaliação dos policiais merece crédito, mas a garantia do devido processual legal pressupõe a avaliação feita por um juiz “neutro e desinteressado”, sobrepondo a avaliação de um “policial envolvido no empreendimento muitas vezes competitivo de revelar o crime” – Justice Robert H. Jackson, redator da opinion da Suprema Corte dos Estados Unidos, caso Johnson v. United States 333 U.S. 10 (1948).

O periculum libertatis, fundamento da prisão preventiva, é caracterizado pelo risco do estado de liberdade de uma pessoa para o desenvolvimento do processo de conhecimento, caracterizado pela garantia à ordem pública ou à ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. Também não foi preenchido.

A decisão se valeu de termos genéricos, sem qualquer indicação de gravidade concreta na conduta do paciente.

A gravidade concreta, portanto, demanda de fundamentação concreta.

A pequena quantidade de droga também é importante para minimizar a suposta gravidade, que torna desproporcional e inadequada prisão preventiva do paciente.

Falacioso o alegado de que apreendido o ínfimo de 7,3 e item 2,6 gramas de cocaína, conforme laudo de constatação (fls;)é suficiente para a mercancia. O STF, em 2015, considerou a quantidade de 25,8 gramas de cocaína (ou seja, superior a encontrada em posse do paciente) como sendo inapta a induzir a traficância reiterada:

Penal e Processo penal. Habeas Corpus. Tráfico de entorpecentes – art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. Sentença condenatória. Pena fixada no mínimo legal de 5 (cinco) anos. Aplicação da minorante do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas. Pena definitiva de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão. Apelação provida para retirar a minorante. Fundamento: Paciente dedicado ao tráfico. Grande quantidade de entorpecente. Premissa não condizente com a realidade dos autos. 25,80g (vinte e cinco gramas e oitenta centigramas) de cocaína acondicionada em 26 invólucros. Quantidade inapta a induzir à traficância reiterada (fundamento para decotar a minorante). Primariedade, bons antecedentes, residência fixa e vários registros de emprego na CTPS. Traficante eventual movido pelas circunstâncias. Constrangimento ilegal. (…) (HC 129466/SP, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 25/08/2015, DJe 15/10/2015) (grifo nosso)

Outras jurisprudências do STF, e mais recentemente do STJ, também demonstram a inconsistência da decisão do MM. Juízo, proferida em Audiência de Custódia, que não conta com qualquer argumentação idônea para que prospere. Nesse norte, destacam-se:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERAÇÃO DA SÚMULA 691/STF. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 2. A prisão preventiva de jovem com 18 anos de idade pelo tráfico de pequena quantidade de entorpecentes é contraproducente do ponto de vista da política criminal. 3. Habeas corpus a que se nega seguimento. Ordem concedida de ofício. (HC 152964/SP, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 14/02/2018, DJe 19/02/2018) (grifo nosso)

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE EM ABSTRATO DO DELITO. QUANTIDADE DA DROGA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. Nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a preventiva poderá ser decretada quando houver prova da existência do crime (materialidade) e indício suficiente de autoria, mais a demonstração de um elemento variável: (a) garantia da ordem pública; ou (b) garantia da ordem econômica; ou (c) por conveniência da instrução criminal; ou (d) para assegurar a aplicação da lei penal. Para quaisquer dessas hipóteses, é imperiosa a demonstração concreta e objetiva de que tais pressupostos incidem na espécie, assim como deve ser insuficiente o cabimento de outras medidas cautelares, nos termos do art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal, pelo qual a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua sub stituição por outra medida cautelar (art. 319 do CPP). 2. Hipótese em que o juízo de origem lastreou sua decisão tão somente na gravidade em abstrato do delito, circunstância categoricamente rechaçada pela jurisprudência da Suprema Corte . 3. A pequena quantidade da droga apreendida torna desproporcional a decretação da prisão preventiva . Precedentes. 4. Motivação que extrapola o conteúdo do decreto prisional não se presta a suprir a carência de fundamentação nele detectada. 5. Habeas corpus concedido. (HC 135250/SP, Relator Ministro Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 19/09/2016, DJe 28/09/2016) (grifo nosso)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. INADEQUAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO. 2. Havendo prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, a prisão preventiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, poderá ser decretada para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. 3. No caso dos autos, a prisão preventiva da paciente foi decretada com base em fundamentos genéricos relacionados à gravidade abstrata do crime de tráfico de drogas e em elementos inerentes ao próprio tipo penal. Não foram apontados dados concretos a justificar a segregação provisória. Nem mesmo a quantidade de entorpecentes apreendida – 3 gramas de crack e 5 gramas de maconha – pode ser considerada relevante a ponto de autorizar a custódia cautelar da paciente, sobretudo quando considerada sua primariedade e seus bons antecedentes. 4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para revogar a prisão preventiva do paciente , mediante a aplicação das medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP, a critério do Juízo de primeiro grau. (HC 434367/MS, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/03/2018, DJe 20/03/2018) (grifo nosso)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A MEDIDA EXTREMA. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. PRIMARIEDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 2. Considerando a natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição quando evidenciado, de forma fundamentada e com base em dados concretos, o preenchimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo PenalCPP. Devendo, ainda, ser mantida a prisão antecipada apenas quando não for possível a aplicação de medida cautelar diversa, nos termos previstos no art. 319 do CPP. 3. No caso dos autos, não há fundamentos idôneos aptos a justificar a prisão processual da paciente. A alegação da necessidade de preservação da ordem pública, motivada na gravidade abstrata do delito de tráfico de entorpecentes não constitui fundamento hábil para decretar a prisão preventiva, constituindo, portanto, nítido constrangimento ilegal. 4. Cumpre ressaltar, ainda, que, além de não ter sido apreendida grande quantidade de droga, não há nos autos notícias de envolvimento da paciente em outros delitos, sendo, a princípio, primária e com bons antecedentes. Habeas corpus não conhecido. Concedida a ordem, de ofício, para revogar a prisão preventiva, ressalvada a aplicação de medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, a serem definidas pelo Juiz de primeiro grau, observada, ainda, a possibilidade de decretação de nova prisão, devidamente fundamentada, desde que demonstrada concretamente sua necessidade. (HC 409895/CE, Relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 06/03/2018, DJe 16/03/2018) (grifo nosso)

O paciente permaneceu em silencio na delegacia. De qualquer modo, a falta de indicação precisa de atividade laboral remunerada fixa não é justificativa para a conversão da prisão preventiva .

O STJ possui entendimento de que a ausência de residência fixa e de comprovação de ocupação lícita não podem justificar a segregação cautelar. Nesse norte:

ROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. RESGUARDO DO PROCESSO PENAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE OCUPAÇÃO LÍCITA E RESIDÊNCIA FIXA. MERAS SUPOSIÇÕES. DADOS CONCRETOS NÃO APONTADOS. GRAVIDADE ABSTRATA. CIRCUNSTÂNCIAS PRÓPRIAS DO TIPO PENAL. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. (…) . 2. A prisão processual, por ser medida instrumental, e não antecipatória de pena, necessita reportar -se a dados concretos de cautelaridade, não servindo a mera alusão de que o acusado não comprovou a residência certa e a ocupação lícita e, ainda, de que as circunstâncias próprias do tipo penal seriam justificativas plausíveis. 3. Não se afigura condizente com o estado de proteção social e com as garantias constitucionais considerar elementos sem qualquer indicação concreta desfavorável da pessoa do acusado, como determinantes da prisão preventiva, que é medida extrema de natureza exclusivamente cautelar. 4. Ordem concedida para permitir ao paciente que aguarde o processo em liberdade, se por outra razão não estiver preso. (HC 376650/SP, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 14/02/2017) (grifo nosso)

A falta de atividade laboral remunerada fixa também não é capaz de induzir que se colocado em liberdade, é “presumível que rapidamente retornará às vias delitivas, meio de sustento” . Absurda presunção, inclusive. O magistrado não poderia ter fundamentado sua decisão em presunções, pois isso sequer pode ser considerado como fundamentação concreta. Além disso, há elementos nos autos que refutam veementemente essa alegação, como a primariedade do agente e ostentação de bons antecedentes, que jamais teve envolvimento com o “tráfico”.

Não há risco concreto para a ordem pública se for revogada a prisão preventiva, não se configurando, portanto, o periculum libertatis. Inexiste também qualquer elemento idôneo que ateste que a conveniência da instrução penal e aplicação da lei penal estejam em perigo com a liberdade do paciente.

Importante desde já destacar que o caso em tela se amolda ao art. 33, § 4º da Lei n. 11.343/2006. Significa dizer que na hipótese de condenação, com as reduções devidas, a pena atingiria em ano e oito meses, cujo regime inicial de cumprimento de pena certamente não será o fechado. Há ainda a probabilidade dessa pena privativa de liberdade ser substituída por restritiva de direito (HC 97.256, Relator Ministro Ayres Britto, julgado em 01/09/2010, com a Resolução 5/2012, do Senado Federal).

Em suma, a prisão preventiva imposta configura uma antecipação da pena, e, pior ainda, em regime indubitavelmente mais gravoso. O que torna injustificada a conversão da decisão em questão. Há precedentes nesse exato sentido:

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. DESPROPORCIONALIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. RECURSO PROVIDO. 1. Em se tratando de recorrente primária, que foi presa em flagrante com pequena quantidade de crack (apreensão de cinco pedras), é provável que tenha sua reprimenda e regime modificados quando do julgamento de seus recursos, podendo, até mesmo, ser beneficiada com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Ao que parece, é flagrantemente desproporcional a manutenção da recorrente em cárcere. 2. Recurso provido para revogar a prisão preventiva da recorrente, permitindo -lhe aguardar o julgamento de seu recurso de apelação em liberdade. (RHC 91949/PA, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/03/2018, DJe 21/03/2018) (grifo nosso)

PENA – TRÁFICO DE DROGAS – SUBSTITUIÇÃO DA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA RESTRITIVA DE DIREITOS – INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 44 DA LEI Nº 11.343/2006. A vedação à substituição da reprimenda privativa de liberdade pela restritiva de direitos, prevista na Lei de Tóxicos, foi declarada inconstitucional, ante o princípio da individualização da pena – habeas corpus nº 97.256, relator o ministro Carlos Ayres Britto, julgado em 1º de setembro de 2010 pelo Pleno, acórdão publicado no Diário da Justiça de16 de dezembro imediato. PENA – EXECUÇÃO – REGIME DE CUMPRIMENTO. Não se tratando de réu reincidente, ficando a reprimenda no patamar de 4 anos e sendo as circunstâncias judiciais positivas, cumpre observar o regime aberto e apreciar a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos – artigos 33 e 44 do Código Penal. (HC 125188/SP, Relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 04/10/2016, DJe 31/01/2017) (grifo nosso)

Trata-se, em verdade, de aplicação antecipada de regime mais severo do que a pena que pode vir a ser aplicada, sem qualquer motivação para tanto, o que pode ser entendido como afronta à Súmula 719 do STF.

O STF também já assentou entendimento no sentido de que o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º da Lei de Drogas) não possui natureza hedionda (HC 118533/MS, Relatora Ministra Carmen Lucia, julgado em 23/06/2016), bem como que não há qualquer vedação para a concessão de liberdade provisória (HC 104.339, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgado em 10/5/2012).

Por fim, vale mencionar que o simbólico RE 641.320/RS, com repercussão geral reconhecida (Tema 423), reconhecendo o alto índice de prisões por “tráficos” de quantidades ínfimas de drogas, fez um apelo ao legislador no seguinte sentido:

Apelo ao legislador para que avalie a possibilidade de reformular a execução penal e a legislação correlata, para: (…) (vi) limitar o número máximo de presos por habitante, em cada unidade da federação, e revisar a escala penal, especialmente para o tráfico de pequenas quantidades de droga, para permitir o planejamento da gestão da massa carcerária e a destinação dos recursos necessários e suficientes para tanto, sob pena de responsabilidade dos administradores públicos;

Diante do exposto, e com a devida observação ao art. 33, § 4º da Lei de Drogas, não restou configurado o periculum libertatis, e não há enquadramento em nenhuma das hipóteses do art. 313 do CPP . Uma vez ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, deve ser revogada, concedendo a liberdade provisória , pela inteligência do art. 321 do CPP.

b) Das Medidas Cautelares Diversas Da Prisão

Na hipótese de se considerarem presentes os requisitos do art. 312, e a observância do art. 313, ambos do CPP, que ao menos sejam impostas medidas cautelares diversas da prisão, com base no art. 282, § 6º e art. 319, ambos do CPP.

O art. 282, § 6º do CPP é categórico ao impor que a prisão preventiva somente será decretada quando não for cabível sua substituição por outra medida cautelar , dispostas no art. 319 do mesmo diploma processual.

No caso em tela é plenamente possível a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, por serem eficazes e menos gravosas que a restrição da liberdade de alguém.

As alegações para não implantação das medidas cautelares diversas da prisão no caso em apreço não se sustentam. O MM. Juízo não fundamentou exaustivamente o porquê de serem, cada uma das medidas cautelares previstas, insuficientes.

A aplicação, ainda, se justifica diante da primariedade do paciente e ostentar bons antecedentes, bem como ser nítido caso de tráfico privilegiado. Nesse sentido:

Cabe ressaltar que ambas as Turmas desta Suprema Corte já decidiram, a respeito de situações como a destes autos, que a pequena quantidade da substância proibida encontrada em poder do agente não constitui, por si só, motivo suficiente para justificar a medida extraordinária da prisão cautelar, ainda mais quando se estiver em face do denominado “tráfico privilegiado” (Lei nº 11.343/2006, art. 33, § 4º) e resultar provado que o suposto autor da infração penal em referência preenche os requisitos fixados em mencionada norma legal (…). (HC 144716/SP, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 16/10/2017, DJe 18/10/2017) (grifo nosso)

EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. SÚMULA 691/STF. AFASTAMENTO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. MOTIVAÇÃO GENÉRICA E ABSTRATA. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. Em casos teratológicos e excepcionais, viável a superação do óbice da Súmula 691 desta Suprema Corte. Precedentes. 2. Motivado o decreto prisional de forma genérica e abstrata, sem elementos concretos ou base empírica idônea a ampará -lo, esbarra na jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Federal, que não lhe reconhece validade . Precedentes. 3. Substituição da prisão preventiva por medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, a serem fixadas pelo juízo de primeiro grau. 4. Ordem de habeas corpus concedida para substituir a prisão preventiva decretada contra o paciente por medidas cautelares ao feitio legal. (HC 127167/SP, Relatora Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 12/05/2015, DJe 24/06/2015)

Assim, diante do não acolhimento dos pedidos anteriores, entendendo-se presentes os requisitos que autorizam a prisão preventiva, requer sejam impostas as medidas diversas da prisão (art. 319 do CPP), em atenção ao art. 321 e 282, ambos do CPP. Isso porque são medidas menos gravosas que a restrição da liberdade do paciente, medida esta que não se justifica no presente caso .

III –DA ORDEM DA LIMINAR

O fumus boni iuris encontra-se demonstrado pela desnecessidade da prisão, conforme exposto acima. O periculum in mora, por sua vez, decorre do fato de que o paciente se encontra preso, por fundamentação inidônea, sem qualquer amparo jurisprudencial ou legal.

Assim, requeiro a concessão da medida liminar para que o paciente aguarde o julgamento do processo em liberdade, revogando -se a prisão preventiva decretada.

IV –DO PEDIDO

Diante de todo o exposto, estando presente o fumus boni juris e o periculum in mora, requer:

A concessão da ordem liminar para determinar a expedição do ALVARÁ DE SOLTURA ao Paciente NOME DO PRESO COMPLETO, RG XXXXXXXXXXXX SSP/SP, CPF/MF nº 999.999.999-99.

Ante o exposto, demonstrada a ilegalidade do ato da autoridade coatora, requer seja revogada a prisão preventiva , ou, subsidiariamente, entendendo pela manutenção da prisão preventiva, requer sejam impostas medidas diversas da prisão, nos exatos termos do art. 319 e 321, ambos do CPP.

 Por fim, seja o presente pedido de habeas corpus julgado procedente ao final, por esta Câmara do Tribunal de Justiça, confirmando-se a respeitável r.decisão liminar.

Requer todas as publicações e intimações, DOESP, sejam feitas em nome dos advogados: EDIMAR FERREIRA GOMES, OAB/SP 340.866, sob pena de nulidade.

Nestes Termos,

Pede Deferimento.

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