EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA xxx VARA DO TRABALHO DE xxx – TRT xª REGIÃO.
AUTOS Nº xxxxxxx
xxxxxxx, devidamente qualificado nos autos em epígrafe, na EXECUÇÃO TRABALHISTA que lhe promove a xxxxxxxx, também já devidamente qualificada, por suas advogadas que a esta subscrevem, vem respeitosamente a douta e sábia presença de Vossa Excelência, arguir a IMPENHORABILIDADE do bem objeto da penhora de fls.19 (id. xxxxx), nos seguintes termos:
Nos presentes autos, foi penhorado o imóvel objeto de matrícula nº xxx registrado perante o Cartório de Registro de Imóveis dexxxxxx.
Ocorre, no entanto, que referido bem é o único imóvel residencial do executado e serve-lhe de residência, sendo, portanto, impenhorável nos termos do art. 1º da Lei 8.009/90.
Nesse ínterim, pode-se verificar através da certidão emitida pelo Cartório de Registro de Imóveis de xxxx (anexa), que de fato o imóvel em questão é o único que pertence ao executado, o que também pode se verificar pelo teor da certidão do oficial de justiça (id.xxxxx – fls. 29), sobre a ocupação do imóvel penhorado, sendo este ocupado pelo Embargante e sua família.
Para mais, o Executado junta as contas de consumo, comprovando que reside no imóvel que foi penhorado nos autos do processo.
Além disso, todas estas situações podem ser constatadas por meio de vistoria a ser efetuada por Oficial de Justiça, através de mandado de constatação, o que desde já requer.
Não obstante, a alegação de impenhorabilidade do referido bem, por se tratar de matéria de ordem pública, de natureza constitucional, que não sofre os efeitos da preclusão, pode ser feita a qualquer tempo e fase do processo, até a extinção da execução.
Ora, Excelência, como se pode observar, o prosseguimento do feito implicará na realização de medidas que tornarão definitiva a expropriação do único imóvel do executado e no qual reside.
No sentido de que o bem de família não poderá ser objeto de penhora e nem ao menos de transação, por se tratar de matéria regida por norma de caráter público e, por isso, insuscetível de disposição, César Fiúza estatui que:
“O objetivo do legislador foi o de garantir a cada indivíduo, quando nada, um teto onde morar mesmo que em detrimento dos credores. Em outras palavras, ninguém tem o direito de jogar quem quer que seja na rua para satisfazer um crédito. Por isso o imóvel residencial foi considerado impenhorável. Trata-se aqui, do princípio da dignidade da pessoa humana. O valor personalidade tem preeminência neste caso, devendo prevalecer em face de um direito de crédito inadimplido.” (Novo Direito Civil p. 155 ED. DEL REY 2003 BELO HORIZONTE) (grifos nossos).
Cumpre ressaltar a importância que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana assume no ordenamento jurídico, devendo-se estendê-lo não como forma supletiva das lacunas da lei, mas sim como fonte normativa, apta a exercer sua imperatividade e cogência nas relações jurídicas.
Nesta seara, seria interessante citar a opinião do autor Humberto Theodoro Júnior, ao descrever os princípios informativos do processo de execução, elucida de maneira brilhante a matéria:
“É aceito pela melhor doutrina e prevalece na jurisprudência o entendimento de que a execução não deve levar o executado a uma situação incompatível com a dignidade humana. Não pode a execução ser utilizada como instrumento para causar a ruína, a fome e o desabrigo do devedor e sua família, gerando situações incompatíveis com a dignidade da pessoa humana. Nesse sentido, institui o código a impenhorabilidade de certos bens como provisões de alimentos, salários, instrumentos de trabalho, pensões, seguros de vida, etc.
(…) a execução deve ser útil ao credor, e, por isso, não se permite sua transformação em instrumento de simples castigo ou sacrifício do devedor.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – Processo de execução e processo cautelar. Rio de Janeiro: 28 ª edição, Forense, 2000, p. 12/13.)
Nesse sentido, colecionamos os seguintes julgados:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. No caso, não há falar em omissão no julgado, pois o Regional explicitou, de forma clara e completa, as razões pelas quais deu parcial provimento ao agravo de petição interposto pela esposa do segundo executado para reformar a sentença e determinar o cancelamento da constrição sobre o imóvel, pois incontroverso nos autos que se tratava de bem impenhorável, nos termos do art. 1º da Lei nº 8.009/90, não havendo falar em preclusão. Quanto ao momento em que a impenhorabilidade do bem de família foi levantada pelo segundo executado, destacou-se que, “tratando-se de matéria que comporta análise de ofício não há preclusão”, frisando que “se fosse mantida a penhora de imóvel impenhorável por força de lei, só serviria de causa de pedir em ação rescisória, que em nada ajudaria a exequente”. O fato de o Juízo a quo não ter decidido conforme as pretensões do ora agravante não constitui negativa de prestação jurisdicional. Portanto, foi prestada a devida jurisdição à parte, mantendo-se ileso o comando inserto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Recurso de revista não conhecido. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. Na hipótese, não ficou configurado o alegado cerceamento do direito de defesa nem a ofensa ao artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, porquanto o Regional, ao determinar o cancelamento da penhora do bem de família de propriedade do segundo executado, resguardou o direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório de ambas as partes. Recurso de revista não conhecido. EXECUÇÃO. COMPROVAÇÃO DE QUE O IMÓVEL PENHORADO CONSTITUI BEM DE FAMÍLIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. ARGUIÇÃO NA FASE DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. OFENSA À COISA JULGADA NÃO CONFIGURADA. Trata-se de controvérsia sobre a possibilidade ou não de reconhecimento do bem de família, para fins de impenhorabilidade, após a expedição da carta de adjudicação. O Juízo de origem entendeu que a alegação de impenhorabilidade do bem de família, levantada pelo segundo executado, estava preclusa, pois, “mesmo podendo a impenhorabilidade do bem de família ser alegada por simples petição, ela deve ser arguida em momento oportuno, e não após concluído todo o processo de adjudicação, com expedição da carta e já com o registro no Cartório de Imóveis”. O Regional, por sua vez, deu parcial provimento ao agravo de petição interposto pela esposa do segundo executado para reformar a sentença e determinar o cancelamento da constrição sobre o imóvel, por considerar que, “em face da incontrovérsia de que o imóvel é a residência do sócio executado, sua esposa e filhos, trata-se de bem impenhorável, nos termos do art. 1º da Lei nº. 8.009/90, além de não estarem presentes quaisquer das exceções do seu art. 3º”. Nesse contexto, concluiu a Corte a quo que, ao contrário das assertivas do exequente, não há falar em preclusão nem em ofensa à coisa julgada, porque a impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública e o seu desrespeito é causa de nulidade absoluta, arguível a qualquer tempo, até o final da execução, podendo ser conhecida de ofício. De fato, pacificou-se nesta Corte superior o entendimento de que a nulidade da penhora que recai sobre o bem de família pode ser alegada em qualquer momento e até mesmo por simples petição, porquanto se trata de nulidade absoluta, sem que se possa falar em preclusão. Nesse sentido, aliás, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça (precedentes). Assim, a jurisprudência deste Tribunal Superior também vem firmando o entendimento de que a alegação de existência de bem de família, para fins de impenhorabilidade, por se tratar de questão de ordem pública, não é passível de preclusão, podendo ser arguida enquanto não exaurida a execução (precedentes). No caso em exame, conforme registrado no acórdão recorrido, ficou incontroverso que o imóvel penhorado, de propriedade do segundo executado, constituía bem de família, motivo pelo qual é imperioso reconhecer sua impenhorabilidade, nos termos e para os efeitos da Lei nº 8.009/90. Pelas razões expostas, não há falar em ofensa ao artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal. Assim, deve ser mantida a determinação de levantamento da constrição que recaiu sobre o imóvel em que reside o segundo executado, pois comprovada a condição de bem de família. Recurso de revista não conhecido .
(TST – RR: 1052006920055150004, Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 20/09/2017, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/09/2017) (grifos nossos).
IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. NORMA DE ORDEM PÚBLICA. ALEGAÇÃO A QUALQUER TEMPO E POR SIMPLES PETIÇÃO. Tendo em vista que a alegação de impenhorabilidade do bem de família pode ser aviada a qualquer tempo e por simples petição, o Juízo de Origem deveria ter conhecido dos embargos à execução apenas quanto a essa matéria, a qual não se submete ao quinquídio legal do artigo 884, da CLT.
(TRT-2 – AGVPET: 12988220115020 SP 00012988220115020447 A28, Relator: SERGIO ROBERTO RODRIGUES, Data de Julgamento: 12/11/2013, 11ª TURMA, Data de Publicação: 21/11/2013) (grifos nossos).
Com isso, conclui-se que: a impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública, contrária à incidência de preclusão, devendo ser, inclusive, reconhecida de ofício pelo juiz, independentemente da fase em que se encontrar a execução.
Portanto, por ser bem de família, a penhora do imóvel objeto de matrícula nº xxx registrado perante o Cartório de Registro de Imóveis de xxxx, deve ser cancelada, posto que lhe deva ser assegurados os direitos básicos outorgados por lei, como o direito a ter moradia e, principalmente, o direito a ter uma vida digna, o que se restabelecerá, no caso presente, desconstituindo-se o ato pelo qual foi constrito o bem de família, na medida em que se afigura direito indisponível.
Diante do exposto, requer-se o acolhimento da presente arguição, para determinar:
a) o cancelamento definitivo da penhora realizada no imóvel objeto da matrícula nº xxx registrado perante o Cartório de Registro de Imóveis de xxxxxx.
b) a expedição de mandado de vistoria a ser cumprido por Oficial de Justiça a fim de constatar esta situação.
Termos em que,
Pede Deferimento.
xxxxxx, 09 de novembro de 2021.